O Brasil não tem presidente, não tem imprensa, nem oposição
forte: o Brasil só tem a nós! Por Lucas Berlanza, publicado no Instituto
Liberal
Desperto hoje estarrecido e indignado. Não apenas com a
decisão revoltante do Supremo Tribunal Federal. Não também com o apêndice
preocupante da forte possibilidade de saída do Ministro da Fazenda, Joaquim
Levy, abrindo as portas para a posse de um eventual desenvolvimentista
ensandecido que vá apimentar ainda mais a gastança irresponsável e a impressão
de dinheiro. Não apenas com a Constituição sendo rasgada aos olhos de todos,
com direito a transmissão da Globo News. Não. O que mais irrita é o dia amanhecer
como se fosse uma manhã como qualquer outra.
Noutros tempos, tenho certeza de que seria diferente. Ao
tempo, por exemplo, como bem lembrou o historiador Marco Antônio Villa, da
chamada “banda de música” udenista, de nomes como Aliomar Baleeiro, Afonso Arinos,
Carlos Lacerda e Olavo Bilac Pinto, que não davam sossego aos governos
getulistas, do PSD e do PTB, Dilma e os ministros do STF não teriam sequer
condições de dormir à noite com o incêndio que eles causariam. Hoje, mesmo
nossos melhores nomes na oposição não são capazes de condensar os clamores
populares e incensarem os instrumentos do Estado contra a sua própria
perversão. Os melhores parlamentares e senadores de hoje não têm, ou o mesmo
talento argumentativo, ou o mesmo dom de oratória, ou a mesma ousadia. Em
especial o maior partido oposicionista, o PSDB, é pusilânime por sua própria
natureza; as exceções, como Carlos Sampaio, não representam os caciques da
legenda, e não podem, por si sós, mover montanhas. O ministro do STF, Gilmar
Mendes, disse hoje que há “um projeto de bolivarização da Corte” e que “ontem,
infelizmente, tivemos mostras disso”. Acusou os colegas de promover um
“artificialismo jurídico” para julgar por “casuísmo”. O ex-presidente do STF,
Carlos Ayres Britto, disse que a Corte errou. Apenas um tom muito mais tímido
podemos esperar de nossos opositores políticos oficiais.
De nosso governo, que cometeu o crime, que se acumplicia de
tudo o que há de mais populista, mais falsário, mais estelionatário e mais
autoritário, nada mais digo. A presidente, em si, é um enfeite presunçoso e
pedante que representa tão-somente uma face de um projeto de poder e de um
esquema ideológico muito maiores do que ela – e para os quais, aliás, ao menos
para alguns de seus setores, sua falta absoluta de carisma e sua ineptidão
robusta já constituem mais um estorvo que um reforço. Que dizer de nossa
imprensa? Tudo que temos visto em 2015 foi o sepultamento do nosso Jornalismo,
de nos fazer corar. Manipulações de fotos e vídeos para engrandecer
manifestações governistas, seleções patéticas de entrevistados esdrúxulos para
caracterizar manifestações imensas de golpistas, a vergonhosa sessão de
perguntas a Hélio Bicudo sobre Eduardo Cunha quando o assunto era o impeachment
de Dilma, a “martelada” dos noticiários contra o presidente da Câmara quando
havia várias citações e escândalos envolvendo o PT e a família de Lula. Tudo
muito triste, mas não mais do que a covardia de dar nome aos bois. Os
jornalistas, ontem e hoje, nada mais farão que discursos protocolares, oficialescos,
artificiais, como se a sessão de ontem houvesse sido normal, como se nada de
extraordinário houvesse ocorrido. Sua postura é e será, conhecendo-os como
conhecemos, entendendo o que aconteceu durante o ano inteiro como entendemos,
pior do que o absoluto silêncio. Será um desprezo profundo das proporções. Para
que se faça justiça à sessão de 17 de dezembro, precisaremos esperar, talvez,
pelos livros didáticos de historiadores de um futuro nebuloso.
Que tem o Brasil hoje? O Brasil só tem a nós. Cada um de
nós. Os brasileiros decentes, que compartilham as mesmas angústias e dividem as
mesmas dificuldades, que suam dia e noite para manter suas vidas e de suas
famílias e, em consequência, sustentar a economia deste gigante combalido,
gerar e fazer circularem as riquezas; os brasileiros que as vêem surrupiadas,
então, pelo Estado paquidérmico e corrupto, que sequestra suas expectativas e
desdenha de suas queixas. O Brasil só tem a nós, e o Brasil somos nós.
Nosso sincero desejo, nossos sinceros votos para 2016 e mais
além, é que isso baste. Que mesmo diante dos percalços, dos problemas, dos
imensos rochedos de desesperança que esse teatro de gângsters e duelistas
ladinos nos proporciona, nossa força seja inquebrável, persevere, desafie o
edifício da mentira e da avacalhação. Que tenhamos referências de virtude
pública, ainda que provindas das vozes do passado, em que possamos nos inspirar
para acreditar que podemos ser melhores do que isso. Que lotemos as ruas em
março, ou quando quer que sejam convocadas as novas manifestações. Que
mostremos a eles, que mantém essa tragicomédia efêmera, destinada a se apagar
no lixo dos séculos, que a vitalidade do país está em nós, na nossa iniciativa,
no nosso envolvimento, na nossa dedicação e na nossa honestidade.
Não temos mais do que isso. Temos a nós mesmos. Que isso
seja tudo. Que isso seja o bastante. Que isso baste para que o Brasil vença a
escuridão tempestuosa que atravessa e possa, ao fim de um túnel de sofrimento,
enxergar a luz.
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