quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Desordem dos advogados do Brasil

Sobral Pinto
Rodorval Ramalho: A desordem dos advogados do Brasil

Da Midia Sem Máscara.

Em tempos de disputa na Ordem dos Advogados do Brasil, tenho me lembrado dos inúmeros depoimentos sobre o exercício da advocacia, ouvidos ao longo da vida, que me remetem a uma imagem bastante desfavorável de uma profissão que pode ser tão importante para construirmos um verdadeiro Estado de Direito.

Os “causos”, as piadas, os chistes sobre advogados são abundantes e sempre nos transmitem um conteúdo que tem como foco a esperteza, a malícia, a ardileza e, ao fim e ao cabo, a falta de limites para a ação profissional. Esse tipo de imaginário sobre a natureza e/ou o modus operandi dos profissionais da advocacia tem uma profunda importância sociológica, pois é produto de uma longa experiência.

Pois bem, parece uma unanimidade, não somente no imaginário popular, que qualquer causa e qualquer cliente é defensável. Afinal, todos têm direito a um advogado para que a justiça seja aplicada de forma adequada. Lembremos de dois ou três casos.

Qual foi o comportamento dos criminalistas brasileiros, entre eles, Márcio Thomaz Bastos, também apelidado modestamente de “God”, durante o processo do Mensalão? Qual tem sido o comportamento dos criminalistas nesse processo do Petrolão? Como tem se comportado o exército de advogados do PCC Brasil afora?

Outro dia, Almir Pazzianotto Pinto, advogado do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo na época de Lula, contou que o Apedeuta costumava alertá-lo, já naquele tempo, que “não queria advogado para dizer o que eu [Lula] tenho que fazer. Eu quero advogado para me livrar depois que eu fizer.” O problema é que esse tipo de raciocínio não é exclusividade das mentalidades delinquentes, mas, infelizmente, de uma infinidade de profissionais da advocacia.

O próprio Márcio Thomaz Bastos, em artigo na Folha de São Paulo, chegou a defender que “Não há exagero na velha máxima: o acusado é sempre um oprimido”. E ainda afirmou:

“Ao zelar pela independência da defesa técnica, cumprimos não só um dever de consciência, mas princípios que garantem a dignidade do ser humano no processo. Assim nos mantemos fiéis aos valores que, ao longo da vida, professamos defender. Cremos ser a melhor maneira de servir ao povo brasileiro e à Constituição livre e democrática de nosso país.”

Naquela altura, “God” já havia feito de tudo para livrar a cara dos petistas no processo do Mensalão e já estava “de corpo e alma” em outra causa nobre, defender o pio Carlinhos Cachoeira, mais um “oprimido pela justiça”.

A pergunta para refletirmos é: uma defesa jurídica é só um artefato técnico ou haveria algo mais a ser perseguido?

O grande Heráclito Fontoura Sobral Pinto, um dos maiores brasileiros da história, pode nos ajudar a responder essa questão. Atentemos para o que diz essa avis rara do direito nacional:

“O primeiro e mais fundamental dever do advogado é ser o juiz inicial da causa que lhe levam para patrocinar. Incumbe-lhe, antes de tudo, examinar minuciosamente a hipótese para ver se ela é realmente defensável em face dos preceitos da justiça. Só depois de que eu me convenço de que a justiça está com a parte que me procura é que me ponho à sua disposição”.

Sigamos com o jurista católico:

“A advocacia não se destina à defesa de quaisquer interesses. Não basta a amizade ou honorários de vulto para que um advogado se sinta justificado diante de sua consciência pelo patrocínio de uma causa. O advogado não é, assim, um técnico às ordens desta ou daquela pessoa que se dispõe a comparecer à Justiça. O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da justiça, incumbindo-lhe, por isto, aconselhar àquelas partes que o procuram a que não discutam aqueles casos nos quais não lhes assiste nenhuma razão”.

Por fim, mais uma dose de decência:

“É indispensável que os clientes procurem o advogado de suas preferências como um homem de bem a quem se vai pedir conselho. Orientada neste sentido, a advocacia é, nos países moralizados, um elemento de ordem e um dos mais eficientes instrumentos de realização do bem comum da sociedade”.

Que o espírito de Sobral Pinto ilumine as consciências que ainda acreditam que a advocacia não é somente uma “técnica de caça a tesouros”, mas uma dimensão ética da própria vida republicana.

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