Estadão
Quinze dias após a presidente Dilma Rousseff ser reeleita no
segundo turno da disputa presidencial em 2014, o ex-ministro da Casa Civil
condenado no mensalão José Dirceu discutia com interlocutores petistas as
indicações dos ministérios do segundo mandato da presidente e previa
dificuldades para Dilma. As revelações foram encontradas em mensagens de
whatsapp no celular do ex-ministro apreendido pela Polícia Federal na Operação
Lava Jato.
“Tem que ser nomes com visibilidade e aceitação na sociedade
em amplos setores de cada área, senão não acabará bem esse mandato”, avaliou
Dirceu em diálogo com a historiadora e militante petista Maria Alice Vieiras em
10 de novembro de 2014. Na época o ex-ministro ainda cumpria em regime domiciliar
sua pena de sete meses e 11 anos de prisão por corrupção no mensalão e a
ex-ministra e senadora Marta Suplicy estava prestes a deixar o Ministério da
Cultura e, posteriormente, o próprio PT.
Ex-assessora política do ex-ministro, Maria Alice conversava
com ele sobre diversos assuntos políticos nessa época e também articulava o
contato do ex-ministro com colegas e políticos. Na ocasião, eles conversaram
sobre a saída de Marta da pasta e a possibilidade de ela deixar o PT para
disputar a Prefeitura de São Paulo em 2016, o que acabou ocorrendo.
“Falei com Fernando sobre cultura e ele citou Samuel
Guimarães…viu que Marta já fala em ir para outro partido, disputar a eleição em
16!!!”, exclamou o ex-ministro. “Barreto vem almoçar quarta-feira, disse que é
urgente, deve ser o mesmo assunto”, segue Dirceu, que não poupa críticas ao PT
no diálogo.
“Por aqui o que se diz que ela no PT disputará prévias com
Haddad, uma loucura. Samuel não tem condições, acho que. Porque mesmo que todos
esses processos são tão mal encaminhados?”, indaga Maria Alice.
“Não acredito que o PT aceitará e cometerá de novo esse
erro”, responde o ex-ministro. “Ele e ela se desentenderam pelo visto, e muito,
no passado…”, segue o petista, que mesmo afastado da vida política e cumprindo
sua pena no mensalão discute nomes com Maria Alice, chega a sugerir o nome do
ex-prefeito de Ouro Preto (MG), Angelo Oswaldo e pede para Maria Alice falar
com os petistas de Minas sobre o assunto.
VEJA O DIÁLOGO EM QUE DIRCEU SUGERE O NOME DE ANGELO OSVALDO
PARA O MINISTÉRIO DA CULTURA
Um dia após o diálogo, Marta Suplicy deixou oficialmente o
Ministério da Cultura, pasta assumida por Juca Ferreira e, em abril de 2015 ela
se desfiliou do partido com duras críticas ao PT, fortemente desgastado com os
desdobramentos da Lava Jato que apontam o partido como um dos principais
beneficiários do esquema de corrupção na Petrobrás. Em setembro de 2015 ela se
filiou ao PMDB, sendo uma das principais cotadas para disputar a Prefeitura de
São Paulo pelo partido.
O conteúdo das mensagens confirma o que já havia informado a
reportagem do Estado em junho deste ano que afirmava que Dirceu, embora
afastado oficialmente da política, ainda acompanhava de perto as movimentações
do PT.
Em agosto de 2015 ele foi preso enquanto ainda cumpria
prisão domiciliar no mensalão, desta vez acusado de receber propinas no esquema
de corrupção na Petrobrás, e atualmente Dirceu é réu na Justiça Federal no
Paraná respondendo pelos crimes de corrupção, organização criminosa e lavagem
de dinheiro. No último dia 24 de dezembro a presidente Dilma publicou um
decreto de indulto natalino que pode livrar o ex-ministro de sua pena pelo
mensalão. A defesa de Dirceu deve pedir o benefício ao Supremo. O indulto,
contudo, não livra o ex-ministro do processo do qual é réu na Lava Jato.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE DIRCEU:
O criminalista Roberto Podval, que defende o ex-ministro,
afirmou que “Dirceu foi condenado no mensalão, mas não esta morto, o direito de
atuar politicamente não lhe foi tirado, portanto, é obvio que o mesmo mantinha
contatos com vários amigos e falava sobre política”.
O advogado lembra ainda que o próprio juiz Sérgio Moro, ao
ser confrontado com os diálogos, apontou que eles não implicavam Dirceu em
nenhuma irregularidade relacionada ao processo da Lava Jato do qual ele é réu.
COM A PALAVRA, MARIA ALICE VIEIRAS:
“É de conhecimento público que assessorei José Dirceu desde
o momento em que o mesmo resolveu defender-se publicamente. Além disso, fui
responsável pelas atividades relacionadas à sua história política, recebendo
pesquisadores, organizando palestras, realizando pesquisas para artigos e
publicações e também sobre a geração de 68.
A partir de sua condenação na AP470, em 2012, e
principalmente após sua prisão no final de 2013, meu contato com ele diminuiu
muito, mas sempre que possível conversamos e trocamos opiniões sobre episódios
relacionados a política brasileira e ao PT. Além disso, inúmeros amigos e
companheiros, agentes políticos ou não, me procuravam durante esse período
querendo conversar e ver o José Dirceu. E eu, em alguns casos, articulei essas
conversas. Vale lembrar que foi mais ou menos nesse período que ele passou ao
regime aberto, o que possibilitou ao mesmo retomar contato com pessoas que não
o viam há tempos.
Também é público o fato de que a prisão de José Dirceu não
anulou seus interesses sobre os rumos do país e sobre a disputa política pesada
que por aqui se estabeleceu. Ele sempre acompanhou e, inclusive, posicionou-se
diariamente sobre todos os temas relacionados à política e à economia em seu
blog, mesmo depois que foi preso.
Diante disso, essas mensagens, telegráficas, entrecortadas e
pontuais, nada dizem além disso: troca de impressões e de opiniões. Não tenho a
menor ideia dessa fala dele sobre Jacy Afonso e mídia, tanto que não respondi
esse comentário. Sobre a disputa da Câmara, o diálogo é genérico e não deve ter
maiores significados. Envolver todo mundo quer dizer envolver o conjunto do PT,
todos os grupos e correntes. E não tenho detalhes sobre o envolvimento direto
dele nessa disputa.
Por último, não tenho cargo no PT nem na Fundação.
Att,
Maria Alice”
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