sábado, 17 de outubro de 2015

Rio, a capital da esculhambação

Resolvi reproduzir a crônica de hoje do Aydano em que ele fala da diferença entre Rio e Sampa na qualidade dos serviços, no que tange ao material humano.

Eu já sabia alguma coisa sobre Sampa, narrada por uma amiga carioca que se casou e foi morar lá. Entre outras coisas, ela me disse espantadíssima que lá a gente liga para um serviço qualquer como o conserto de uma máquina de lavar e o técnico vem, uniformizado e na hora marcada!

Aqui no Rio, quiuspariu!, o cara aparece dois dias depois, todo mulambento, diz que tem que comprar uma peça, leva o dinheiro e nunca mais aparece! 

Aydano André Motta: Lições da metrópole cinza

“A cozinha fecha em 20 minutos.” A frase bate no ouvido carioca, cansado de guerra, como o prenúncio de um cartão vermelho furioso. Quando o prazo se encerrar (ou antes), virão a folclórica água no pé, as cadeiras sobre as mesas e as caras e bocas hostis, para anunciar a expulsão, certa como a morte. Nesta história aqui, #sóquenão. O desfecho vem muito além do tempo previsto - e é abençoadamente outro.

Questão de endereço: a cena se dá em São Paulo, aquela terra cinza, que, nos serviços, oferece lições de sobra a certos balneários. O grupo numeroso desembarca na Pizzaria Margherita, nos Jardins, por volta de 1h10m da madrugada. Adriano, garçom tímido e atencioso, começa a atender a pequena multidão sedenta de chopes e vinhos.

Pouco depois de 1h30m, chega nova leva, espalhando-se por três mesas grandes, quase 30 comensais. Pizzas e bebidas continuam saindo madrugada adentro, até as 4h, quando vai-se embora o último cliente. Adriano e seus companheiros encerram o expediente muito além da hora, mas com generosas gorjetas, como convém.

Na jornada, inexistiram muxoxo, cara feia, grosseria, corpo mole. Os profissionais enxergaram a oportunidade, dedicaram-se além do que previam seus contracheques - ou, cruzes!, holerites, no dialeto local - e terminaram recompensados. Jogo (bem) jogado.

Está bom? Vai melhorar. Fim da noite de domingo, um solitário táxi espera numa ruazinha da Vila Olímpia. Três pessoas se aproximam, o motorista avisa que espera uma corrida, mas acelera na cortesia:

- Meu passageiro ainda demora. Entrem que levo vocês no ponto, aqui atrás.

A viagem dura poucos minutos - com o taxímetro desligado. Aos interlocutores lívidos, o homem avisa que “é uma carona”, não faria sentido cobrar.

Mimos do gênero semeiam nos eternamente maltratados cariocas a alegria de crianças na manhã de Natal. No Rio, pobres, ricos e remediados se apertam tragicamente no mesmo barco do serviço sofrível. Enquanto Adriano, o garçom, e o taxista da Vila Olímpia entendem que estão ali para trabalhar, do lado de cá da Ponte Aérea seus colegas enxergam ofícios semelhantes como indignos. Enquanto não conseguem ir embora, tentam ludibriar a clientela. Se for turista, então, capricham na bandalheira, na cultura inquebrável de que visitante está aqui para ser roubado.

Nos serviços, a linda terra do Flamengo e da Mangueira, dos bambas e do entardecer no Arpoador se traveste feia como a necessidade. E, à beira das Olimpíadas, não dá sinais de mudança. Por aqui, vigora o pensamento do garçom de um bar descolado do Leblon, ninho de artistas, musas e outros bichos. Numa noite calorenta, deu de ombros ao turista que desistiu após esperar muito além do razoável para ser atendido.

- Do lado da praia, cercado de mulher bonita, e ainda com pressa para ser atendido? Ah, fala sério...

Na volta, um dos cariocas bem tratados em São Paulo decidiu que ia pegar o ônibus no Santos Dumont até o metrô. Fracassou - era feriado, e o serviço não funciona. Derrotado, rendeu-se à quilométrica fila do táxi que serpenteava pelo terminal.

Mas, na viagem até em casa, a vista estava um espetáculo.

3 comentários:

  1. (argento) ... por sorte, habitei Sampa, capital da Locomotiva BraZilis, por tempo considerável e suficiente para saber que o "artigo" falta, e muito, com a verdade ...

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    1. (argento) ... porque, como disse, habitei Sampa, ganhei dinheiro em Sampa diverti-me em Sanpa e tive tempo de observar Sampa com o mesmo grau de intimidade com que observei o "RioMaravilha" - o problema são os Rótulos e a "capacidade" (tendência) de interpreta-los e descrevê-los - o "Rio Maravilha" já foi capital e, quando capital, oferecia maior quantidade de "Emprego" e menos de Traalho; por outro lado Sampa sempre ofereceu Trabalho. Sampa difere, hoje, do "RioMaravilha" por dois motivos: Sampa não tem praia e o "RioMaravilha" não oferece Trabalho, ... nem Emprego.

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