domingo, 22 de dezembro de 2013

Crie uma religião: é fácil! Difícil vai ser acabar com ela...

Hélio Schwartsman: O fim de uma religião

“Annuntio vobis tristitiam magnam...”. Ops. Idioma errado. Eu vos anuncio com grande tristeza que me tornei ex-sacerdote. Sim, a Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio, instituição por mim fundada no ano da graça de 2009, foi fechada. Já não tenho o direito legal de não pagar impostos.

Quatro anos atrás, eu e meus colegas Claudio Angelo e Rafael Garcia criamos a tal igreja com o propósito de mostrar como era fácil escapar a tributos através de organizações religiosas. O experimento foi um sucesso. Com apenas R$ 418 e cinco dias (não consecutivos) de trâmites burocráticos, conseguimos registrar o culto e abrir uma conta bancária na qual pudemos fazer aplicações financeiras livres de impostos.

Cumprido tal desígnio, decidimos fechar a igreja. Bem, foi mais difícil encerrá-la do que abri-la, como se pode constatar pelos anos transcorridos. É verdade que muito do atraso se deveu a desleixo nosso. Afinal, não tínhamos urgência e aí o pecado da preguiça fala mais alto.

Isso não significa que não houve armadilhas burocráticas. Minha favorita é a da notificação de excomunhão. Cada um dos sócios-fundadores tomara um rumo. Claudio saiu da Folha e Rafael passou uma temporada no exterior. A fim de simplificar o processo e em consonância com os poderes que me autoatribuí nos estatutos da igreja, eu os excomunguei, para que pudesse assinar a papelada sozinho. O cartório, porém, não se deixou persuadir e cobrou as correspondentes notificações de excomunhão. O jurídico da Folha me convenceu de que era mais fácil ir atrás dos sócios do que argumentar.

Nós perseveramos e nesta semana os advogados me informaram que a igreja foi finalmente encerrada.

A pergunta fundamental que motivou o experimento permanece sem resposta: faz sentido isentar igrejas de todos os tributos quando eles são cobrados de setores mais essenciais à vida, como alimentação e saúde?

Um comentário:

  1. Pense num absurdo, no Brasil tem precedente. Qualquer coisa que envolva trabalhar, produzir, solucionar ou encontrar soluções para algum problema, encontra muita burocracia e outros obstáculos. Algo que felizmente está extinto desde a privatizações da telefonia é o tal do "telefone comercial", lembra? Usar o telefone na empresa, gerando emprego e riquezas, custava mais caro e tinha uma taxa maior que o telefone residencial, sob o pretexto de que estava sendo usado para ganhar dinheiro, para obter lucro. O Brasil é um país que conseguiu incentivar o uso do telefone por fofoqueiras de tempo integral e desestimular o uso do telefone em atividades produtivas.
    Atualmente (há décadas) os departamentos mais importantes das empresas são o contábil e o jurídico, que se dedicam a encontrar maneiras de burlar as leis ou obter vantagens com as falhas na lei. Empresários que não tem recursos para manter departamentos jurídicos e contábeis são reféns da fiscalização, paga tudo calado ou é autuado e multado.

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