Hélio Schwartsman: O fim de uma religião
“Annuntio vobis tristitiam magnam...”. Ops. Idioma errado.
Eu vos anuncio com grande tristeza que me tornei ex-sacerdote. Sim, a Igreja
Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio, instituição por mim fundada no ano da graça
de 2009, foi fechada. Já não tenho o direito legal de não pagar impostos.
Quatro anos atrás, eu e meus colegas Claudio Angelo e Rafael
Garcia criamos a tal igreja com o propósito de mostrar como era fácil escapar a
tributos através de organizações religiosas. O experimento foi um sucesso. Com
apenas R$ 418 e cinco dias (não consecutivos) de trâmites burocráticos,
conseguimos registrar o culto e abrir uma conta bancária na qual pudemos fazer
aplicações financeiras livres de impostos.
Cumprido tal desígnio, decidimos fechar a igreja. Bem, foi
mais difícil encerrá-la do que abri-la, como se pode constatar pelos anos
transcorridos. É verdade que muito do atraso se deveu a desleixo nosso. Afinal,
não tínhamos urgência e aí o pecado da preguiça fala mais alto.
Isso não significa que não houve armadilhas burocráticas.
Minha favorita é a da notificação de excomunhão. Cada um dos sócios-fundadores
tomara um rumo. Claudio saiu da Folha e Rafael passou uma temporada no
exterior. A fim de simplificar o processo e em consonância com os poderes que
me autoatribuí nos estatutos da igreja, eu os excomunguei, para que pudesse
assinar a papelada sozinho. O cartório, porém, não se deixou persuadir e cobrou
as correspondentes notificações de excomunhão. O jurídico da Folha me convenceu
de que era mais fácil ir atrás dos sócios do que argumentar.
Nós perseveramos e nesta semana os advogados me informaram
que a igreja foi finalmente encerrada.
A pergunta fundamental que motivou o experimento permanece
sem resposta: faz sentido isentar igrejas de todos os tributos quando eles são
cobrados de setores mais essenciais à vida, como alimentação e saúde?
Pense num absurdo, no Brasil tem precedente. Qualquer coisa que envolva trabalhar, produzir, solucionar ou encontrar soluções para algum problema, encontra muita burocracia e outros obstáculos. Algo que felizmente está extinto desde a privatizações da telefonia é o tal do "telefone comercial", lembra? Usar o telefone na empresa, gerando emprego e riquezas, custava mais caro e tinha uma taxa maior que o telefone residencial, sob o pretexto de que estava sendo usado para ganhar dinheiro, para obter lucro. O Brasil é um país que conseguiu incentivar o uso do telefone por fofoqueiras de tempo integral e desestimular o uso do telefone em atividades produtivas.
ResponderExcluirAtualmente (há décadas) os departamentos mais importantes das empresas são o contábil e o jurídico, que se dedicam a encontrar maneiras de burlar as leis ou obter vantagens com as falhas na lei. Empresários que não tem recursos para manter departamentos jurídicos e contábeis são reféns da fiscalização, paga tudo calado ou é autuado e multado.