Instituto Paulo Montenegro e Ação Educativa mostram evolução
do alfabetismo funcional na última década
Pequena introdução:
O significado de alfabetismo funcional
A definição de analfabetismo vem, ao longo das últimas décadas,
sofrendo revisões significativas como reflexo das próprias mudanças sociais. Em
1958, a UNESCO definia como alfabetizada uma pessoa capaz de ler e escrever um
enunciado simples, relacionado a sua vida diária. Vinte anos depois, a UNESCO
sugeriu a adoção dos conceitos de analfabetismo e alfabetismo funcional.
Portanto, é considerada alfabetizada funcionalmente a pessoa capaz de utilizar
a leitura e escrita e habilidades matemáticas para fazer frente às demandas de
seu contexto social e utilizá-las para continuar aprendendo e se desenvolvendo
ao longo da vida.
Os níveis de alfabetismo funcional são:
Analfabeto - Corresponde à condição dos que não conseguem
realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases ainda que
uma parcela destes consiga ler números familiares (números de telefone, preços
etc.);
Rudimentar - Corresponde à capacidade de localizar uma
informação explícita em textos curtos e familiares (como um anúncio ou pequena
carta), ler e escrever números usuais e realizar operações simples, como
manusear dinheiro para o pagamento de pequenas quantias ou fazer medidas de
comprimento usando a fita métrica;
Básico - As pessoas classificadas neste nível podem ser
consideradas funcionalmente alfabetizadas, pois já lêem e compreendem textos de
média extensão, localizam informações mesmo que seja necessário realizar
pequenas inferências, lêem números na casa dos milhões, resolvem problemas
envolvendo uma sequência simples de operações e têm noção de proporcionalidade.
Mostram, no entanto, limitações quando as operações requeridas envolvem maior
número de elementos, etapas ou relações;
Pleno - Classificadas neste nível estão as pessoas cujas
habilidades não mais impõem restrições para compreender e interpretar textos em
situações usuais: lêem textos mais longos, analisando e relacionando suas
partes, comparam e avaliam informações, distinguem fato de opinião, realizam
inferências e sínteses. Quanto à matemática, resolvem problemas que exigem
maior planejamento e controle, envolvendo percentuais, proporções e cálculo de
área, além de interpretar tabelas de dupla entrada, mapas e gráficos.
Posto isto, vamos aos resultados:
O percentual da população alfabetizada funcionalmente foi de
61% em 2001 para 73% em 2011, mas apenas um em cada 4 brasileiros domina
plenamente as habilidades de leitura, escrita e matemática
O Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa,
parceiros na criação e implementação do Indicador de Alfabetismo Funcional
(Inaf), lançam mais uma edição da pesquisa que completa uma década. Os
resultados mostram que durante os últimos 10 anos houve uma redução do
analfabetismo absoluto e da alfabetização rudimentar e um incremento do nível
básico de habilidades de leitura, escrita e matemática. No entanto, a proporção
dos que atingem um nível pleno de habilidades manteve-se praticamente
inalterada, em torno de 25%.
Entretanto, os dados do Inaf levantados no mesmo período
indicam que estes avanços no nível de escolaridade da população não têm
correspondido a ganhos equivalentes no domínio das habilidades de leitura, escrita
e matemática. Somente 62% das pessoas com ensino superior e 35% das pessoas com
ensino médio completo são classificadas como plenamente alfabetizadas. Em ambos
os casos essa proporção é inferior ao observado no início da década. O Inaf
também revela que um em cada quatro brasileiros que cursam ou cursaram até o
ensino fundamental II ainda estão classificados no nível rudimentar, sem
avanços durante todo o período.
“Apesar dos avanços, tornam-se cada vez mais agudas as
dificuldades para fazer com que os brasileiros atinjam patamares superiores de
alfabetismo. Este parece um dos grandes desafios brasileiros para a próxima
década”, avalia Ana Lúcia. “Os dados reforçam a necessidade de investimento na
qualidade, uma vez que o aumento da escolarização não foi suficiente para
assegurar o pleno domínio de habilidades de alfabetismo: o nível pleno
permaneceu estagnado ao longo de uma década nos diferentes grupos demográficos”.
Para Vera Masagão, coordenadora geral da Ação Educativa, os
dados do Inaf mostram que a chegada de novos estratos sociais às etapas
educacionais mais elevadas vem, muitas vezes, acompanhada da falta de condições
adequadas para que estes estratos alcancem os níveis mais altos de alfabetismo,
o que reforça a necessidade de uma nova qualidade para a educação escolar, em
especial nos sistemas públicos de ensino. “Outro fator essencial para avançar é
o investimento constante na formação inicial e continuada de professores, que
precisam ser agentes da cultura letrada em um contexto de inovação pedagógica”.
“Essa qualidade não envolve somente a quantidade de horas de
estudo ou a ampliação da quantidade de conteúdos ensinados, mas também fatores
como a adequação das escolas e dos currículos a políticas intersetoriais que
favoreçam a permanência dos educandos nas escolas e a criação de novos modelos
flexíveis que permitam a qualquer brasileiro ampliar seus estudos quando
desejar, em diferentes momentos da vida”, diz Vera.
“Ao longo desta
década consolidou-se a tendência de ampliação das oportunidades educacionais
para todos os brasileiros, com avanços importantes nas regiões e grupos sociais
com menor renda. Por outro lado, evidenciou-se a preocupação com os níveis
insuficientes de aprendizagem revelada pelas avaliações em larga escala do
desempenho escolar, como a Prova Brasil, o ENEM e outros de âmbito estadual e
municipal”, analisa Vera. “Nesse contexto, muitas iniciativas, em âmbito
governamental e não-governamental têm sido postas em marcha para transformar o
direito de acesso à escola no efetivo direito a aprender, não só na escola como
ao longo de toda a vida”.
Resultados por segmentos populacionais
As melhorias nos índices de pessoas funcionalmente
alfabetizadas ocorrem em todas as faixas etárias, mas há persistências de
proporções significativas de pessoas analfabetas entre os mais velhos. Em
nenhuma das faixas etárias consideradas houve aumento significativo da
proporção de pessoas no nível pleno.
Há uma correlação entre a renda familiar e o nível de
alfabetismo, uma vez que a proporção de analfabetos e daqueles incluídos no
nível rudimentar diminui sensivelmente à medida que aumenta a renda familiar. A
evolução do Inaf nesses dez anos revela que os grupos que mais avançaram em
termos de alfabetismo foram aqueles com renda de até dois salários mínimos,
seguidos por aqueles com renda entre dois e cinco salários mínimos, sendo que a
proporção de alfabetizados funcionalmente subiu de 44% para 60% e de 58% para
83%, respectivamente.
Apesar da redução da desigualdade entre brancos e não
brancos em termos de escolaridade ao longo da década 2001-2011, o Inaf aponta,
por exemplo, que a proporção de pessoas funcionalmente alfabetizadas atingiu
80% entre os brancos, 64% dentre os pretos/negros e 69% entre os pardos (o Inaf
utiliza a mesma categoria cor/raça do IBGE, a partir da auto declaração dos
sujeitos entrevistados).
Analisando a evolução do alfabetismo ao longo da década nas
diferentes regiões do país, um dado que merece destaque é a região Nordeste
que, em dez anos, conseguiu reverter a situação majoritária de analfabetismo
funcional em 2001-2002 (51%), atingindo 62% de sua população entre 15 e 64 anos
funcionalmente alfabetizadas em 2011.
Ao longo da década, observa-se, ainda, que houve melhora em
relação ao alfabetismo tanto na área urbana quanto na rural. Embora o avanço da
área rural tenha sido significativamente maior, persistem fortes desigualdades
em favor das áreas urbanas: a proporção de analfabetos funcionais na área rural
é de 44% e de 24% nas áreas urbanas.
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