sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Chico Buarque e a Gramática

Professor Reinaldo Azevedo dá uma aulinha de Gramática para Chico Buarque (ué... ele não é o escritor mais premiado de Pindorama?) sobre o texto onde ele confessa sua amnésia.

Não é preciosismo, até porque - parodiando o ditado “todo castigo para corno é pouco” - toda crítica para petralha é pouco. Os erros de Chico não são gritantes, mas, de qualquer maneira são erros, incompatíveis com o status do compositor-escritor.

“Eu não me lembrava de ter dado entrevista alguma a Paulo Cesar de Araújo, biógrafo de Roberto Carlos. Agora fico sabendo que sim, dei-lhe uma entrevista em 1992. Pelo que ele diz, foi uma entrevista de quatro horas onde falamos sobre censura, interrogatórios, diversas fases e canções da minha carreira. Ainda segundo ele, uma das suas perguntas foi sobre a minha relação com Roberto Carlos nos anos 60. No meio de uma entrevista de quatro horas, vinte anos atrás, uma pergunta sobre Roberto Carlos talvez fosse pouco para me lembrar que contribuí para sua biografia. De qualquer modo, errei e por isto lhe peço desculpas.”

E agora vou ao que considero mais importante, já que Chico Buarque é, dados os prêmios que recebeu, nosso prosador mais importante, né? Não sabe escrever. Não sabe, não! É por isso que seus “romances” se caracterizam pela chamada “prosa poética”, que, com raras e gloriosas exceções, costuma ser apenas uma soma de ilogismos e desconexões e cascatas metafóricas aparentemente profundas. Vamos ver.

“Eu não me lembrava de ter dado entrevista alguma a Paulo Cesar de Araújo, biógrafo de Roberto Carlos (…)
Sempre que me deparo com o uso de “algum” em lugar de “nenhum”, fico atento. Pode ser que estejamos diante de um novo Castilho da língua portuguesa, não é? Estou entre aqueles que consideram esse emprego uma licença. Evidentemente, o que remete à melhor língua portuguesa é “Eu não me lembrava de ter dado entrevista NENHUMA”. Para não entrar em minudências, vou para o exemplo:

- Quantos livros de gramática você já leu, Chiquinho?
- Não li algum!
- Hein?
- Não li nenhum!
- Ah, bom…

Admito que a língua culta já assimilou o recurso, empregado antes por gente douta. Ocorre, meus caros, que uma licença pode ser usada por escolha ou por ignorância. Eu poderia, no caso de Chico, condescender com a primeira hipótese não cometesse ele uma batatada ginasiana, um vício detestável de linguagem, muito difícil de corrigir, como sabem os professores de redação. Vejam:
“Pelo que ele diz, foi uma entrevista de quatro horas onde falamos sobre censura, interrogatórios, diversas fases e canções da minha carreira”.

Onde falamos???

O uso do advérbio “onde” como se pronome relativo fosse é coisa de gente que, definitivamente, não domina a inculta & bela, ainda que possa versejar. O correto, sem alternativas ou escolhas nesse caso, é: “Pelo que ele diz, foi uma entrevista de quatro horas em que (na qual) falamos sobre censura, interrogatórios, diversas fases e canções da minha carreira.

Não se pode empregar o “onde” numa oração subordinada? Sim. Desde que se trate da chamada oração subordinada adverbial locativa - ausente, de forma injustificada, da Nomenclatura Gramatical Brasileira. Um exemplo que não deve ser seguido por ninguém? Lá vai:
“Escrevo melhor onde é permitido fumar”
Notem que, nesse caso, o “onde” não pode ser substituído por “em que”.

Vá lá que se possa, no uso coloquial, empregar o “onde” com valor de pronome relativo. Vamos a um exemplo:
“Este é um país onde cantores querem se comportar como censores”.

É uma construção a ser evitada, leitor amigo. Como a intenção do emissor é construir uma oração subordinada adjetiva restritiva, faz-se o certo, com a mesma economia de recursos,  assim:
“Este é um país em que cantores querem se comportar como censores”

E por que é assim? Porque o fito da mensagem não se volta para a circunstância de “lugar”; o que se quer é especificar é o tipo de país. Admito, no entanto, que, nesse caso, a contaminação da oração subordinada adjetiva restritiva pela subordinada locativa é compreensível. Mas voltemos ao texto de Chico Buarque:
“Pelo que ele diz, foi uma entrevista de quatro horas onde falamos sobre censura, interrogatórios (…)”

Entrevista, agora, é uma circunstância de lugar?

E deixo de barato o “por isto” em lugar de “por isso”, emprego também obrigatório porque ele se refere a algo já enunciado e não por enunciar. Como o trabalho para escrever uma coisa ou outra é o mesmo, faz o certo quem sabe.

Se Chico fosse só alguém que soltasse trinados por aí e um candidato a censor, deixaria pra lá o que a muitos pode parecer mera pegação no pé. Mas já que ele é o mais premiado prosador brasileiro, considero uma obrigação verificar a qualidade de sua prosa.

Um comentário:

  1. Quem cometeu erros foi o Reinaldo Azevedo! Veja isto: http://www.euvoupassar.com.br/?go=artigos&a=qXYRRRJdPYjqb6wUvWznfHSxdmteIqWqOp9RdVAJi1c~

    ResponderExcluir