sábado, 25 de maio de 2013

Boato

Essa correria à Caixa por causa do boato sobre o fim da Bolsa Família me fez lembrar de uma situação curiosa que passei em 1973 quando espalharam o boato que a Delfin, a da Caderneta de Poupança, tinha quebrado. Meu pai era então o diretor administrativo da empresa.

No dia, o corre-corre comia solto e eu, já sabendo do caso, resolvi ir à agência Ipanema, onde a gerente era minha amiga de longa data, para saber dela como andavam as coisas por lá. Muita fila, muita agitação, mas, segundo Lola, tudo estava sob controle e, na medida do possível, ela conseguia convencer alguns clientes que a quebra da Delfin não passava de boato. Fui lá de curioso - eu não trabalhava na Delfin - e de paquera. De vez em quando Lola e eu namorávamos um pouco.

E não é que durante a nossa breve conversa me chega uma senhora esbaforida, pede licença e manda:

- Lola, eu preciso tirar o meu dinheiro todo da poupança!

- Mas por que, dona “Fulana”? - Perguntou Lola.

- Ah!, acabei de saber agora que um diretor da Delfin já fugiu para a Argentina, um tal de Moacyr Froes! - respondeu dona “Fulana”.

Estupefato, mesmo assim não resisti a ser irônico, metendo-me onde não tinha sido chamado, antecipando uma resposta de Lola:

- Puxa, dona “Fulana”, será que ele fugiu sem me avisar?

- Como?... Quem é o senhor?

- Sou filho do “tal” Moacyr Froes, minha senhora - respondi ao mesmo tempo que tirava minha carteira do bolso para mostrar minha Identidade -. Se ele foi para a Argentina, não me contou. Além disso, se foi mesmo, muito provavelmente ele deve estar ainda no aeroporto, porque faz pouco mais de uma hora que eu o vi, em casa. Saímos juntos - e mostrei minha identidade indicando a filiação.

Lola, que não sabia onde se enfiar de vontade de rir e, possivelmente, de vergonha pela senhora, virou-se de costas, enquanto a mulher, atônita, examinava minha Identidade.

- Ma... mas o senhor é filho dele mesmo, do diretor? - perguntou dona “Fulana” enquanto me devolvia o documento.

- Sim senhora, em carne e osso. Pode ficar tranquila e deixar seu dinheiro com a Lola, que isso tudo é boato.

E Lola reforçou:

- Claro que é boato, dona “Fulana”. A Delfin só perde em captação para a Caixa Econômica e está na frente do Bradesco. Para ela “quebrar”, o Bradesco teria que ir primeiro. Além de tudo conheço a família do Ricardo desde que nasci. Somos mais do que parentes. Foi o tio Moacyr que me deu a gerência daqui.

Lola usou um argumento meio chinfrim, o do Bradesco - não adiantava explicar de outra maneira -, mas junto com a firmeza sobre nosso quase parentesco, tudo funcionou. Dona “Fulana” acabou desistindo de tirar seu dinheiro, até porque, como mais um reforço, eu ofereci a ela que falasse diretamente com meu pai na Delfin pelo telefone da agência (não havia celulares), o que ela, aparentemente já convencida, declinou (ainda bem, porque àquelas alturas do campeonato, meu pai não ia me atender nem a pau, preocupado que estava em tentar abastecer de dinheiro as agências do Brasil inteiro devido ao excesso descomunal de saques).

É claro que meu pai não tinha fugido, mas uma coincidência dessas merecia um jantar. Jantamos juntos, Lola e eu, e ainda demos boas risadas.

Só jantamos.

P.S.: Antes que alguém pense que meu pai ainda era diretor à época da intervenção, comunico que ele saiu da Delfin em 1975 e morreu em 1977. Detalhe: quem trabalhava na Delfin em 21 de janeiro de 1983, dia em que o Banco Central interveio na empresa, era eu!

3 comentários:

  1. Pode ser que a minha pergunta seja boba, a Delfin deixou de existir?P
    Por que o BC interviu? Ja nao vivia no Brasil e nao lembro das intervencoes so lembro mesmo do crime do Collor.
    Cade a Lola? Ha uma musica muito chatinha do The Kinks intitulada Lola.

    .http://www.youtube.com/watch?v=Ixqbc7X2NQY

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  2. Por causa de injunções políticas e do desprezo com que Ronald Levinson tratava os políticos à época, a Delfin foi submetida à intervenção.

    Sei muito bem porque eu estava sentado em cima do estopim da coisa, o alegado motivo para a intervenção. Eu administrava um terreno na Barra, de 1,5 milhão de metros quadrados que a Delfin tinha comprado através de financiamentos do governo com juros irrisórios, mas tudo perfeitamente legal, onde estavam sendo construídos 15 mil apartamentos. Como Ronald tivesse muitos inimigos e estivesse do lado errado na política, aliado a Andreazza, cujo tapete também foi puxado (era candidato a candidato à presidência, contra Tancredo, mas foi preterido por Maluf - logo por quem!), por causa do tal terreno, inventaram uma inadimplência que não existia e detonaram a Delfin, apesar dos seus (do Ronald) reiterados apelos públicos para que alguém dissesse quanto ele estaria devendo, pois estaria disposto a pagar - e tinha dinheiro para isso -, mas o governo se fez de surdo e nunca mais falou no assunto.

    Quanto a Lola, casou-se, teve dois filhos e separou-se. Faz uns cinco anos que não a vejo.

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  3. Espero que a Lola nao tenha intervencionada ahahahahahahhahahah

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