Dois artigos na Folha de hoje comentam a eleição do democrata
esquerdista Bill Di Blasio para prefeito de Nova Iorque depois de 20 anos de
domínio republicano. Em um deles, Marina Silva, como não poderia deixar de ser,
dá vivas ao “surgimento de um novo sujeito político e de mudanças no ambiente
social e cultural em que a política acontece”, preocupadíssima que está com “os
21% da população que vivem abaixo da linha de pobreza na capital financeira do
mundo”. O problema é que ela não sabe - porque não quer saber - que esses 21% não
são favelados e, se fossem classificados pelo IBGE, estariam na classe média,
com seus U$ 9 mil (R$ 20,7 mil) de renda per capita.
Em outro, Hélio Schwartsman, põe em dúvida a política
combatida por Di Blasio, o “stop and frisk” (parar e revistar), baseada na
filosofia da tolerância zero. Entre 2004 e 2012, a polícia de Nova Iorque abordou
4,4 milhões de pessoas nas ruas, revistando-as em busca de armas e drogas,
sendo que 80% deles foram negros e latinos, e é claro que isso despertou a ira
do pessoal dos direitos civis, que foi buscar reparações na Justiça.
Quem defende a medida argumenta que ainda que inocentes
arbitrariamente parados sofram uma injustiça, isso seria plenamente compensado
pelo benefício geral. Quem é contra diz que ela é francamente racista e fomenta
a desconfiança entre policiais e a população dos bairros pobres, o que é
contraproducente no médio prazo, e já que não existem estudos de qualidade a
demonstrar o nexo entre as revistas e a diminuição da delinquência, seus
detratores também alegam que são submetidos a um constrangimento desnecessário.
Particularmente, eu não tenho nada contra o “stop and frisk”.
E explico. Do final dos anos 60 até meados dos 70, aqui no Rio, eu era “arbitrariamente
revistado” na rua, de dia ou de noite, pelo menos uma vez por mês. Era jovem,
andava em turmas, a maconha estava em franca ascensão entre a juventude e a
ditadura comia solta, com os milicos vendo suspeitos até em suas próprias
sombras. Portanto, eu era um suspeito em potencial, embora fosse absolutamente
careta e apolítico. Nunca me importei com isso porque o resultado desse “zelo” policial era
todos terem a tranquilidade de andar para baixo e para cima a qualquer hora,
sem o menor risco de serem assaltados ou sofrerem algum tipo de violência
(ainda era a polícia civil que fazia esse tipo de patrulhamento e, com
raríssimas exceções, todos eram muito educados - por favor e obrigado ainda
faziam parte do vocabulário).
É claro que havia os revoltados com esse tipo de situação,
normalmente os mais folgados, como Cabeção, que sempre se gabava do coronelato
do pai, até que em uma madrugada, a turma toda reunida na praça General Osório,
como fazíamos todo sábado depois de termos deixado as namoradas em casa -
namorada tinha hora para chegar - e comido uma pizza no restaurante em frente,
chega um camburão pela calçada e os policiais nos pedem documentos. E Cabeção, folgado como
sempre:
- Os seus primeiro!
E o policial:
- Não está vendo que sou policial?
E Cabeção:
- Bem feito! Quem mandou não estudar?
E foi um perrengue. O policial pegou Cabeção, jogou
dentro do camburão e fechou a caçapa, detido por desacato à autoridade. Com muito
custo, muita conversa nossa e lágrimas do folgado a pedir desculpas pela
gracinha, dizendo que tinha sido brincadeira, soltaram Cabeção, que sumiu por
um mês.
“Causos” à parte, eu
não acho que uma revista seja uma humilhação a ninguém, mas quem busca chifre
em cabeça de burro vai achar muito mais. E continuar sendo assaltado...
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