domingo, 11 de janeiro de 2015

Flávia Oliveira e seu “politicamente correto” na contramão da decência e da competência

Confesso que até a semana passada eu tinha uma certa admiração por Flávia Oliveira, principalmente quando ela escrevia uma coluna sobre economia, mas qual foi minha - enorme - decepção ao ler o artigo abaixo publicado no Globo de Domingo passado. Um prato cheio de preconceitos e recalques.

Mal na foto - Flávia Oliveira

Na escolha do ministério, Dilma desperdiçou a chance de promover a construção de igualdade que promete no discurso

Lá pelo 60º parágrafo da longa carta-compromisso apresentada como discurso de posse, Dilma Rousseff tratou de construção da igualdade. Afirmou que o Brasil tem como destino ser um país desenvolvido e justo, onde as pessoas tenham os mesmos direitos, “independentemente de raça, credo, gênero ou sexualidade”. A presidente foi precisa nas palavras, mas falhou na representação. Seu retrato oficial com os 39 titulares do primeiro escalão do governo é um desfile de homens brancos. Há seis mulheres, uma negra; ninguém assumidamente homossexual. As ministras de Direitos Humanos, Mulheres e Igualdade Racial, por menos importantes, foram agrupadas na última fila. Para a parede vai a velha imagem, desigual como sempre, do andar de cima da política brasileira. O segundo mandato, aquele de construir biografia, começou mal na foto.

A história de vida da presidente, que enfrentou a tortura por combater um regime de força, sugere ser verdadeiro seu compromisso com um Brasil democrático, de oportunidades para todos. Nada disso é visível na composição do governo. Homens brancos estão em 85% dos cargos top; na Câmara eleita em outubro passado, a proporção é de 72%, calculou o Laeser/UFRJ; entre os empregadores na PME/IBGE, são 48%. Interesses político-partidários predominaram na seleção dos ministeriáveis, em detrimento tanto da meritocracia quanto dos modelos de ação afirmativa.

A participação das mulheres minguou no segundo mandato, sem que o primeiro escalão sequer tenha diminuído de tamanho. Não faz sete meses, a presidente sancionou a Lei 12.990, que reserva para negros 20% dos postos de trabalho oferecidos em concursos públicos federais. Na composição da equipe, Dilma desperdiçou a chance de, espontaneamente, aplicar a legislação que ajudou a criar.

Se o fizesse, enviaria aos brasileiros pretos e pardos a mensagem de possibilidade de ascensão aos cargos máximos da nação. Foi o papel que ela própria encarnou em 2010 (e voltou a exaltar três dias atrás), quando tornou-se a primeira mulher presidente da República. Foi a posição que, solitariamente, Joaquim Barbosa desempenhou ao assumir uma cadeira (e, depois, a presidência) no Supremo Tribunal Federal. Atos simbólicos também ajudam a quebrar ciclos de perpetuação de papéis sociais.

Difícil acreditar que não exista no país um engenheiro negro de pensamento ortodoxo, currículo assemelhado ao de Joaquim Levy, para conduzir a Fazenda pelos caminhos do tripé macroeconômico que Dilma abraçou no discurso de posse. Ou que não haja uma brasileira doutora em economia por universidade americana, como Alexandre Tombini, para assumir o Banco Central. Ou uma médica capacitada em gestão e planejamento para, como Arthur Chioro, comandar o Ministério da Saúde. Certamente, o Brasil tem gays, negros e mulheres formados em Direito, com mandato em Câmara Municipal, cargo executivo em empresa pública e experiência em assessoria parlamentar para estar à frente dos Transportes, cargo de Antonio Carlos Rodrigues.

Dilma reconhece no discurso a necessidade de igualdade, mas nega protagonismo aos grupos que penam com a exclusão. Boas intenções constroem leis e políticas públicas. Tomara, elas venham. Mas representação subjetiva também desmonta modelos arcaicos de hierarquia.

Pelo que eu li dela até Domingo passado, nem sequer passava pela minha cabeça que Flávia tivesse ideias tão imbecis e posturas tão radicais a favor do “politicamente correto”. Apesar da situação e da oposição estarem criticando contundentemente o ministério de Dilma exatamente pela falta de critérios técnicos, e até mesmo partidários - o PROS já declarou que Cid Gomes, seu filiado, não representa o partido -, Flávia quer, acima de tudo, um ministério escolhido por sexo e cor da pele.

Até mesmo das raras quase unanimidades, como é o caso de Joaquim Levy, ela diz que prefere “um engenheiro negro de pensamento ortodoxo”; para o lugar de Tombini, uma “brasileira doutora em economia por universidade americana” e no de Antonio Carlos Rodrigues, nos transportes, um gay “formado em Direito”, entre outras coisas.

Será que passa pela cabeça de alguém minimamente inteligente e honesto adotar esse tipo de descritérios para escolher um ministro? Reparem que as críticas de Flávia ao ministério de Dilma sequer mencionam probidade ou algo parecido, também na contramão das críticas que apontam vários ministros como protagonistas de picaretagens mil.

É lamentável, mas o Brasil caminha inexoravelmente para a total abolição do mérito em detrimento dos preconceitos e recalques politicamente corretos, além, é claro, da roubalheira do PT. Danem-se a honestidade, a competência e o povo, desde que botem gays, mulheres, negros e ladrões para comandar nossas vidas.

Mal na foto ficou você, Flávia!

Um comentário:

  1. Ela esqueceu de mencionar a importância de ser criado o Ministério da Música para o Eduardo Suplicy ser ministro.

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