sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Dicas de um ex-panicado

Já que o pânico-depressão do Boechat viralizou, eu aproveito para publicar o último capítulo do livrinho que escrevi em 2009 sobre a minha convivência de 25 anos com a Síndrome do Pânico. São algumas dicas, mas frisando bem que elas foram baseadas exclusivamente na minha experiência e nas minhas conclusões.

“Isso é algo que não desejo nem para meu pior inimigo”.

“De repente, eu senti uma terrível onda de medo, sem nenhum motivo. Meu coração disparou, tive dor no peito e dificuldade para respirar. Pensei que fosse morrer.”

“Tenho tanto medo... Toda vez que me preparo para sair, tenho aquela desagradável sensação no estômago e me aterrorizo pensando que vou ter outra crise de pânico.”

Resolvi juntar alguns pontos interessantes sobre o MEU pânico em forma de dicas. Faço questão de frisar bem que é a MINHA experiência pessoal de panicado essencialmente ansioso, sem um pingo de depressão, mas a maioria das observações podem ser úteis a todos os que penam com essa titica.

Para começar eu peço licença para entrar numa área meio perigosa de definições e causas, mas como eu já me considero um pós-graduado na matéria – nem que seja pelo tempo de sofrimento, eu me permito transmitir o que eu li e ouvi de mais coerente, o parágrafo abaixo:

“O cérebro produz substâncias chamadas neurotransmissores que são responsáveis pela comunicação que ocorre entre os neurônios (células do sistema nervoso). Estas comunicações formam mensagens que irão determinar a execução de todas as atividades físicas e mentais de nosso organismo (ex: andar, pensar, memorizar, etc). Um desequilíbrio na produção destes neurotransmissores pode levar algumas partes do cérebro a transmitir informações e comandos incorretos. Isto é exatamente o que ocorre em uma crise de pânico: existe uma informação incorreta alertando e preparando o organismo para uma ameaça ou perigo que na realidade não existe. É como se tivéssemos um despertador que passa a tocar o alarme em horas totalmente inapropriadas. No caso do Transtorno do Pânico os neurotransmissores que encontram-se em desequilíbrio são: a serotonina e a noradrenalina.”

Exatamente por isso, os tratamentos analíticos e comportamentais só podem aliviar a ansiedade e, mesmo assim não satisfatoriamente. A yoga ou exercícios diversos podem fazer o mesmo efeito - ou até melhor - que as psicoterapias, só que nada disso vai resolver um problema bioquímico.

“Os sintomas são como uma preparação do corpo para alguma “coisa terrível”. A reação natural é acionar os mecanismos de fuga. Diante do perigo, o organismo trata de aumentar a irrigação de sangue no cérebro e nos membros usados para fugir - em detrimento de outras partes do corpo e as principais manifestações incluem:
Contração / tensão muscular, rijeza
Palpitações (o coração dispara)
Tontura, atordoamento, náusea
Dificuldade de respirar (boca seca)
Calafrios ou ondas de calor, sudorese
Sensação de “estar sonhando” ou distorções de percepção da realidade
Terror - sensação de que algo inimaginavelmente horrível está prestes a acontecer e de que se está impotente para evitar tal acontecimento
Confusão, pensamento rápido
Medo de perder o controle, fazer algo embaraçoso
Medo de morrer
Vertigens ou sensação de debilidade.”

Tudo isso ao mesmo tempo é dose! Quem já sentiu, sabe.

Agora as minhas observações:

Não lutar contra um ataque de pânico: é inútil. O máximo que se pode fazer é, se estiver dirigindo, por exemplo, parar o carro e esperar passar. Pare tudo que estiver fazendo e não relaxe nem goze: é impossível.

O ataque de pânico não mata.

Os ataques só dão sinais em cima da hora, um minuto antes ou menos. No meu caso era uma batida meio “em falso” do coração.

Nada adianta tentar controlar a respiração, contar de um a cem ou dar cambalhotas. Ainda outro dia eu vi na TV uma mulher se dizendo especialista em pânico e recomendando que se faça doze respirações lentas ao surgir uma crise. Só pode ser piada. Se alguém conseguir pelo menos respirar, mesmo que mal, já é um adianto. Ninguém consegue pensar em absolutamente nada nessas horas.

Os ataques variam entre cinco e dez minutos. Não é uma regra, mas é mais ou menos por aí. Também não adianta olhar para o relógio, ninguém enxerga nada nessas condições.

A primeira providência que qualquer um deve tomar depois da primeira crise é consultar um psiquiatra, de preferência que tenha profundo conhecimento sobre as drogas (medicamentos). Não há outro caminho. Se não houver tratamento adequado, muitos e muitos outros ataques virão.

Hoje já há drogas bastante eficientes para tratar o pânico que, praticamente, não apresentam efeitos colaterais, a não ser um ligeiro soninho no começo do tratamento.

Nunca se auto-medicar. Nem que um suposto “curado” diga que determinado medicamento é infalível. Quem tem que dizer isso é o médico que, se for bom mesmo, saberá avaliar qual a droga mais indicada para o caso de cada um.

É fundamental que o médico inspire confiança ao paciente, mas jamais acreditar naqueles que dizem “isso é mole de curar” é essencial. Não é mole não! Eu já fui a alguns desses. São os mais ignorantes sobre o assunto.

É essencial prestar muita atenção em si mesmo. Ao passar informações detalhadas sobre si próprio ao seu médico é garantia de pelo menos 50% de sucesso no tratamento. Prestar atenção nos mínimos detalhes que pareçam estranhos, mesmo que, para o panicado pareçam irrelevantes, é essencial para um melhor diagnóstico.

Não acreditar em ervas milagrosas, chás, homeopatia ou demais tratamentos “alternativos”. Todos os panicados já fizeram tudo isso e nada deu certo.

Não ligar para palpites, opiniões, críticas ou sugestões de amigos, parentes ou conhecidos. Quem está com o seu na reta é quem tem pânico e, quem nunca teve, não pode avaliar a dimensão do problema. Mandar à mer#$%da, com todas as letras, quem fizer pouco do problema é uma boa válvula de escape.

Quem tem pânico sem tratamento é um eterno ansioso e, eu garanto que, duas doses de qualquer bebida alcoólica alivia essa ansiedade – isso é até cientificamente provado -, mas, o maior problema é ficar só nas duas doses. Portanto, se alguém é chegado em um goró, como eu, que tome muito cuidado: a sensação de alívio é diretamente proporcional ao perigo de virar um alcólatra por conta disso. E mais: é bom lembrar que a ressaca é crise certa e que o fígado é um só. O álcool não é tratamento. Tanto pode funcionar como um paliativo eficiente ou como um inimigo mortal. É bom não arriscar. A história de “não ter ressaca – manter-se bêbado” é piada de mau gosto.

Um ligeiro colírio: não compensa o sofrimento, mas a sensação logo depois de se passar por um ataque de pânico é quase a de um orgasmo.

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