Do Globo
Assentamentos agrários ampliaram o desmatamento da Floresta
Amazônica
Na cartilha do governo federal, os assentamentos agrários da
Amazônia são um modelo de distribuição de terras que garante a exploração de
recursos naturais sem prejuízo ao meio ambiente. No entanto, de acordo com um
novo estudo, publicado na revista “Plos One”, o programa acelera o desmatamento
da floresta.
Esta é a primeira pesquisa dedicada à analise das mudanças
de cobertura da terra. Com base em dados de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) e mapas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra), os biólogos Carlos Peres e Maurício Schneider acompanharam as mudanças
da vegetação amazônica nos últimos 40 anos. No estudo, analisaram cerca de dois
mil assentamentos, distribuídos entre 568 municípios. A incidência de incêndios
e queimadas na área destinada aos colonos é maior do que nas zonas vizinhas. A
cobertura da floresta diminuiu para uma média de 43,5% de seu tamanho original.
O estudo mostra que a derrubada da vegetação foi contínua
nas últimas décadas: “Pequenos proprietários realocados para as zonas
florestais, sem dúvida, operam como agentes fundamentais do desmatamento, e a
maior parte dele ocorre na sequência da migração induzida pelo governo”.
— O Incra sempre argumentou que promovia os assentamentos em
áreas já degradadas, por isso não teria culpa. Demonstramos que estão errados.
A destruição continua mesmo depois da chegada das famílias — comenta Schneider,
que é consultor legislativo da Câmara dos Deputados, um órgão apartidário que
dá assessoria técnica aos parlamentares.
Ele destaca que a derrubada da floresta mudou de motivos com
o passar das décadas. Nos anos 70, os assentamentos visavam à colonização da
Amazônia, e não a reforma agrária. A mata era vista como um obstáculo ao
desenvolvimento do país. Para receber subsídios governamentais, os colonos
precisavam destinar pelo menos metade de suas terras à produção agrícola, o que
alavancou os índices de desmatamento.
— Esta política ocorreu pelo menos até a década de 1980 e se
aplicava mesmo em propriedades instaladas ilegalmente em unidades de
conservação — conta.
O biólogo acrescenta que já existem resoluções federais
estabelecendo o modo de criação das ocupações. As normas, porém, não são
seguidas:
— A instituição de assentamentos em áreas florestadas é
proibida. O governo deveria escolher uma área e deixá-la preparada para o
cultivo da família, ou incluí-la neste processo. Também deve criar um mínimo de
infraestrutura e dar apoio financeiro. Garantir a produtividade de uma região é
caro.
Pedro Bruzzi Lion, consultor da Coordenação de Meio Ambiente
do Incra, admite que o governo precisa investir mais em insumos para o solo,
aumentando a produtividade da agricultura familiar. O órgão entregou ao BNDES
uma carta-consulta, pleiteando R$ 73 milhões do Fundo Amazônia. Os recursos
seriam usados nos próximos dois anos para inovação tecnológica do Incra,
promoção do cadastramento ambiental dos proprietários de assentamentos e
regularização fundiária.
Lion revela que apenas 15 assentamentos contribuem para
metade de todo o desmatamento registrado dentro das ocupações da Amazônia.
— O desmatamento, então, não é um fenômeno espalhado —
pondera. — Há poucos assentamentos problemáticos, onde existem prefeituras e
onde ações ambientais não são bem-vistas pela população e pelas autoridades.
Temos que discutir com o IBGE se estas áreas devem realmente ser consideradas
rurais.
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