segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito

Fábio Medina Osório, presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado: Sinais exteriores de riqueza já bastam

Constitui improbidade administrativa - ilícito tipificado na Lei 8.429/92 - a conduta de político ou servidor que, direta ou indiretamente, adquire, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do seu patrimônio ou renda, cabendo-lhe comprovar, se necessário, a origem lícita desse patrimônio, desses bens e rendas, se alegar sua procedência legítima.

Não se trata, pois, de reprimir apenas a corrupção em si, mas os sinais externos de riqueza incompatíveis com a função pública, o chamado enriquecimento sem causa aparente, uma forma de improbidade autônoma em face da corrupção. De acordo com a Lei de Improbidade, a posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração dos bens e valores que compõem seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada no serviço de pessoal competente, e a mera inobservância desse dever básico já constitui sinal de improbidade.

A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizado no país ou no exterior, e, quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro, dos filhos e de outras pessoas que vivam sob dependência econômica do agente público, excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

As declarações de bens dos agentes públicos serão anualmente atualizadas. Caso haja omissão das autoridades quanto à cobrança dessas atualizações, podem e devem ser denunciadas. O agente público até poderá entregar cópia da declaração de Imposto de Renda, para tentar suprir a exigência legal, mas deve ter claro que a declaração de bens e valores que compõem seu patrimônio privado é mais abrangente do que a própria declaração do Imposto de Renda, pois remete ao conceito de “patrimônio privado”, “bens de qualquer natureza”, “rendas”, além de outras variáveis.

O agente político, nesse contexto, deve prestar contas de sua evolução patrimonial, atuando com transparência e lealdade institucional, eis a razão de ser deste rigor normativo. Atos anômalos, como empréstimos, doações, depósitos em contas próprias ou de terceiros, seja direta ou indiretamente (como beneficiário), devem ser documentados e objeto de controles públicos. Os chamados sinais exteriores de riqueza, incompatíveis com essa declaração anual exigida por lei, já caracterizam suporte para ação de improbidade, se não houver explicações razoáveis do investigado.

O enriquecimento de um agente político não pode ser um mistério, eis que exposto ao escrutínio dos órgãos correicionais competentes e submetido a um regime de relação de especial sujeição com o Estado. Admite-se que um homem público tenha atividades empresariais ou profissionais paralelas, desde que não haja conflitos de interesses com os assuntos públicos que lhe são afetos. E o enriquecimento de seus parentes e pessoas próximas, se a ele relacionado, deverá sofrer idênticos controles. É o caso do uso dessas pessoas, físicas ou jurídicas, como “laranjas”, expressão que designa quem intermedeia transações financeiras ou societárias fraudulentas, emprestando seu nome ou estrutura, documentos ou contas bancárias para ocultar a identidade de terceiros.

Há uma nova legislação que reprime o uso dos “laranjas”, especialmente quando estes se revestem da qualidade de pessoas jurídicas. Trata-se da Lei 12.846/13, a Lei Anticorrupção brasileira, que se interliga às legislações dos países signatários de tratados e convenções internacionais que combatem esses ilícitos.

A constituição de empresas no exterior, ou no Brasil, para ocultar ativos, dissimular interesses ou dificultar investigações pode sujeitar a pessoa jurídica (de que se valha o agente político direta ou indiretamente) às sanções da Lei Anticorrupção do país onde estiverem sediadas, suscitando cooperação internacional estreita. E, é bom lembrar, os mecanismos investigatórios e tecnológicos, aliados ao fim do sigilo bancário internacional, posicionam o crime organizado num inédito patamar de vulnerabilidade em face dos órgãos de repressão públicos, notadamente diante dos avanços de instrumentos como a delação premiada e os acordos de leniência e cooperação internacional entre Ministérios Públicos, sem falar na inteligência e atuação integrada do sistema punitivo internacional, como um todo.

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