Relendo alguns arquivos meus, dei de cara com um que conta a
tal história do assalto que a quadrilha de Dilma fez na casa de Ana Benchimol Capriglione,
amante do ex-governador paulista Adhemar de Barros. Vou reproduzir aqui porque,
além do texto ser histórico e além do fato ser uma séria ameaça à própria
Dilma, caso vingue o intento da ministra Maria do Rosário de acabar com a Lei
da Anistia, Gustavo Schiller, sobrinho de Ana Benchimol, meu colega de
classe durante uns dois ou três anos, foi o informante da VAR-Palmares que
possibilitou o assalto.
O assalto que Dilma ajudou a planejar, por Domitila Becker
A noite estava chegando quando as duas camionetes
estacionaram numa ladeira do bairro de Santa Tereza, no Rio. Armados de
revólveres e granadas, 11 homens e duas jovens desembarcaram e, em movimentos
rápidos, invadiram o casarão onde morava Ana Benchimol Capriglione, amante do
ex-governador paulista Adhemar de Barros, famoso pelo bordão “rouba, mas faz”.
Na hora do crepúsculo de 18 de julho de 1969, começava o maior assalto
praticado durante a ditadura militar por grupos partidários da luta armada.
Disfarçados de policiais à caça de documentos considerados
subversivos, os invasores se espalharam pela mansão. Enquanto alguns subiam ao
segundo andar para localizar o cofre, outros imobilizaram moradores e
empregados, furaram os pneus dos carros estacionados na garagem e cortaram as
linhas telefônicas. A operação durou exatamente 28 minutos. E enriqueceu em US$
2,4 milhões (cerca de R$ 30 milhões em valores atuais) a VAR-Palmares,
organização comunista que tinha entre seus mais ativos militantes a
universitária mineira Dilma Rousseff. “A gente achava que o golpe ia ser
grande, mas não tinha noção do tamanho”, disse Dilma numa entrevista publicada
em 2006.
O cofre de mais de 200 quilos rolou pela escadaria de
mármore, foi colocado numa das camionetes e levado até um “aparelho” ─ termo
que identifica os endereços onde moravam ou se reuniam os partidários da luta
armada ─ em Jacarepaguá. Ali, com o uso de maçaricos, consumou-se o
arrombamento do cofre que fora previamente inundado para evitar que o dinheiro
se queimasse. As cédulas secaram depois de estendidas em varais e expostas a
ventiladores. Eram parte da fortuna do ex-governador de São Paulo. A informação
de que estavam sob a guarda da amante foi transmitida à VAR-Palmares por
Gustavo Buarque Schiller, um sobrinho de Ana Benchimol que acabara de filiar-se
à organização.
Entre os participantes da ação estavam Carlos Minc, deputado
estadual e ex-ministro do Meio Ambiente do governo Lula, e Carlos Franklin
Paixão de Araújo, segundo marido e pai da única filha de Dilma Vana Rousseff
Linhares, ou Estela, ou Wanda, ou Marina, ou Maria Lúcia, ou Luiza. Embora
tenha ajudado a planejar todos os assaltos do grupo, Dilma não figurou entre os
invasores do casarão. Providenciou o armamento, guardou o dinheiro e ajudou a
distribuir o produto do roubo.
O assalto foi concebido para evitar a falência financeira da
VAR-Palmares, fruto da fusão da
Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), liderada por Carlos Lamarca, com
o Comando de Libertação Nacional (Colina), onde Dilma debutou na luta armada
aos 20 anos, a convite do primeiro marido, o jornalista Galeno Magalhães
Linhares. “O Colina foi uma das poucas organizações a fazer a pregação
explícita do terrorismo”, escreveu o historiador Jacob Gorender, que esteve
preso com Dilma no presídio Tiradentes, em São Paulo.
O destino dos US$ 2,4 milhões permanece envolto em mistério.
Uma das versões mais difundidas garante que vários militantes receberam US$ 800
cada um “para emergências” e cerca de US$ 1 milhão foi consumido na aquisição
de armas e carros, no pagamento do aluguel dos aparelhos e na compra de áreas
para adestramento de guerrilheiros. O embaixador da Argélia no Brasil, Hafif
Keramane, foi contemplado com mais US$ 1 milhão para continuar fazendo a ponta
com os militantes exilados. Outros US$ 250 mil foram depositados em contas
secretas da Suíça e, posteriormente, divididos entre os remanescentes da
VAR-Palmares. No livro “A Ditadura Escancarada”, o jornalista Elio Gaspari
informa que o cofre do Adhemar permitiu que parte da cúpula da VAR-Palmares
deixasse de vagar por pequenas casas de subúrbio e se instalasse numa chácara
em Jacarepaguá, equipada com carro estrangeiro e falso motorista.
A fortuna precipitou a desunião. Três meses depois da mais
lucrativa ação desde o início da luta armada, a VAR-Palmares foi rachada ao
meio. Carlos Araújo e Dilma se juntaram aos companheiros da Vanguarda Armada
Revolucionária (VAR), liderada por Antonio Espinosa. Os militantes fieis a
Lamarca ressuscitaram a VPR. Consumada a ruptura, Dilma foi encarregada de
encontrar em São Paulo um abrigo seguro para o arsenal da VAR. Nesse tempo, a
mulher de Carlos Araújo dividiu um quarto de pensão com Maria Celeste Martins
na Avenida Celso Garcia, na Zona Leste. O banheiro era coletivo e as
acomodações bastante precárias.
“Eu e a Celeste entramos com um balde”, contou Dilma numa
entrevista à revista Piauí de abril de 2009. “Eu me lembro bem do balde porque
tinha munição. As armas, nós enrolamos em um cobertor. Levamos tudo para a
pensão e colocamos embaixo da cama. Era tanta coisa que a cama ficava alta. Era
uma dificuldade para nós duas dormirmos ali. Muito desconfortável”. A
ex-ministra continua: “Os fuzis automáticos leves, que tinham sobrado para nós,
estavam todos lá. Tinha metralhadora, tinha bomba plástica. Contando isso hoje,
parece que nem foi comigo”. Presa no início de 1970 com documentos falsos e
armas de fogo, Dilma ficou três anos na cadeia.
A história de outros participantes do roubo foi resgatada
pelo Grupo Tortura Nunca Mais: João Domingos da Silva morreu em setembro de
1969, depois de submetido a sucessivas sessões de tortura. Em abril do ano
seguinte, quando o carro que dirigia foi cercado pela polícia, Juarez Guimarães
de Brito matou-se com um tiro na cabeça. Gustavo Buarque Schiller atirou-se de
um edifício em Copacabana em 22 de setembro de 1985.
Ana Capriglione e os herdeiros do governador nunca
reivindicaram os milhões furtados. Os descendentes da guardiã da fortuna
continuam jurando que o cofre estava vazio.
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