sexta-feira, 12 de junho de 2015

O Congresso nunca foi tão independente

Murillo de Aragão

Circula em Brasília informação que atribui ao ex-presidente Lula um conselho irônico dado ao presidente da Câmara: Eduardo Cunha (PMDB) deveria erigir um busto em homenagem à presidente Dilma Rousseff. Expressaria justa gratidão pelo modo como o governo tratou os parlamentares, no primeiro mandato da presidente, que resultou no estímulo ao crescimento da liderança de Cunha no Congresso e tudo o que ele representa hoje em matéria de poder político.

O fenômeno foi ampliado com os atropelos da campanha eleitoral e a completa e desastrada coordenação política no início do Dilma 2. Além de reforçar o sentimento autonomista da Câmara, a nova realidade gerou uma longa sequência de derrotas concretas para o Poder Executivo.

Para fechar a explicação, criou-se dentro do Congresso uma ojeriza ao PT que mistura mágoa da campanha eleitoral com rejeição à arrogância no trato com aliados. Tais sentimentos estimulam sistemáticas ações de autonomia e repulsa às políticas governamentais, gerando um processo de retaliação que paralisa o Executivo. A situação só não é pior para o governo por causa do apoio condicionado do PMDB ao Planalto. O PT no Congresso é uma força isolada que navega ao sabor dos acontecimentos.

A partir da combinação dos vetores mencionados, o Congresso resolveu usar as emendas constitucionais, que não dependem de veto presidencial, para emparedar o Poder Executivo. Foram aprovadas duas que desagradaram bastante ao governo e reduziram de modo concreto o poder da presidente: a PEC do Orçamento Impositivo para emendas parlamentares e a PEC da Bengala, sobre o adiamento da aposentadoria compulsória de juízes de tribunais superiores.

Outras estão a caminho tratando sobre os mais variados temas. O Congresso discute seriamente como influir na nomeação dos presidentes das estatais. Avança com a questão da terceirização e quer reduzir, via emenda constitucional, o número de ministérios. Há propostas também com o objetivo de alterar o pacto federativo de forma a socorrer a crise financeira de Estados e municípios. É uma nova etapa política que se caracteriza como semiparlamentarista, na qual o Executivo cedeu a iniciativa da elaboração da agenda legislativa ao Congresso, fato inédito na recente experiência da redemocratização.

Como bem disse o jornalista José Casado, em artigo publicado em “O Globo”, na semana passada, parece paradoxal que o Congresso, que está seriamente ameaçado pelas investigações do petrolão, resolva peitar o Poder Executivo e dar tamanha demonstração de força, nunca vista desde a redemocratização do país.

Tal fenômeno decorre da profunda inabilidade política ao longo do governo Dilma 1, época em que o Congresso foi seguidamente desprezado pelo governo. Nunca houve, no Dilma 1, real vontade de fazer a pequena política nem qualquer cuidado em checar se os caciques partidários estavam entregando o prometido à base. O desprezo e a desatenção fomentaram, entre os parlamentares, um sentimento de rebelião muito bem capitalizado por Eduardo Cunha.

No Senado, o sentimento era o mesmo, mas em menor proporção. Todas as lideranças do PMDB, que controla a casa, foram atingidas por algum tipo de agravo vindo do Palácio do Planalto. A devolução, pelo senador Renan Calheiros, de uma medida provisória que tratava das desonerações foi a abertura da caixa de ferramentas. Outras virão e farão do Legislativo de hoje o mais independente em relação ao governo da história política do país.

Um comentário:

  1. Desculpem, mas não vejo independência no congresso, existe um conflito de interesses entre os dois partidos que comandam o executivo, sendo que um deles comanda também o congresso.

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