Cora Rónai se exime de culpa por criticar o regime cubano,
mas nos dá subsídios para fazê-lo. Comento abaixo.
Cora Rónai: A saúde em Cuba
Um dos elogios que se fazem à ditadura cubana é que ela
teria, ao menos, resolvido a questão da saúde pública. Os baixos índices de
mortalidade infantil e a ótima média de vida do país são excelentes e
eloquentes indicadores, ainda que dependam de estatísticas governamentais,
obviamente muito contestadas pelos opositores do regime. Para cada documentário
produzido na ilha louvando as excelências do seu sistema de saúde, há outro,
produzido em Miami, que revela uma situação calamitosa.
Não tenho confiança em nenhum dos lados.
Segundo as estatísticas, a expectativa de vida dos cubanos,
de 78 anos, igual à dos americanos, é três anos superior à brasileira (75) e 14
anos superior à do Haiti (64), que fica logo ali ao lado. O índice de
mortalidade infantil, por sua vez, de menos de cinco óbitos para cada mil
nascimentos, seria até melhor do que o dos Estados Unidos (seis), para não
falar no Brasil (15). Já segundo os médicos dissidentes, haveria sérias
distorções nesses números. Uma acusação que fazem com frequência é que, ao
menor sinal de complicação, as grávidas seriam forçadas a abortar, o que
influenciaria, é claro, os índices de mortalidade infantil.
O Haiti, acima mencionado, é sempre lembrado pelos
defensores da ditadura como exemplo regional do que poderia ter sido o destino
de Cuba, se não fosse por Fidel Castro; isso é injusto. Cuba tinha problemas,
mas nunca esteve sequer perto de se tornar um Haiti. Na verdade, a ilha já
tinha índices de saúde bastante bons antes da revolução. Em 1960, a sua
expectativa de vida era de quase 64 anos, num momento em que a média mundial
estava em pouco mais de 50, a média da região em 56 e a média dos países ricos
em 69. Os índices de mortalidade infantil seguiam essa mesma proporção.
— Eu odeio quando nos comparam ao Haiti! — desabafou a
esposa de um diplomata. — Havana se equiparava com países europeus. Nós sempre
tivemos uma cultura muito forte e bons índices de educação e saúde.
Conversei muito com as pessoas que ia encontrando
aleatoriamente em Havana. E ficou claro para mim que, quando se fala em
medicina cubana, há duas coisas diferentes: os médicos, que teriam boa formação
e que, sem dúvida, gozam da estima da população, e o sistema de saúde, que não
chega a ser a maravilha apregoada pela propaganda oficial.
Um problema sério enfrentado por médicos e pacientes é a
falta de material, de suturas a medicamentos e roupa de cama. Outro é a
corrupção endêmica: há profissionais que desviam produtos dos hospitais e das
clínicas para revendê-los no mercado negro. Não faltam remédios para os
turistas e para os cubanos que podem pagar em CUCs, a moeda forte do país, mas,
para os cubanos que vivem de pesos, até analgésicos são luxo.
Anotei algumas conversas.
Com uma médica ginecologista: “A nossa formação é muito boa
e, sem modéstia, acho que somos ótimos médicos. Mas há um limite para o que
podemos fazer. Temos equipamentos sofisticados, mas volta e meia nos faltam as
coisas mais simples. Então a parte difícil, que é saber o que têm os pacientes
e do que precisam para se curar, está bem resolvida, mas muitas vezes não
adianta nada porque simplesmente não temos com que tratá-los”.
Com a dona de um paladar, que antes trabalhava como
arquiteta: “A medicina cubana precisa ser revista. É um delírio! O Estado não
pode subsidiar toda espécie de tratamento para todas as pessoas, não tem
condições para isso. Qual é o sentido de subsidiar cirurgias estéticas, por
exemplo? Isso é uma extravagância que ainda faria sentido se todos fossem
rigorosamente iguais, mas sabemos que não são. E você sabe como é a natureza
humana: acaba que os ricos e os que têm boas conexões conseguem se tratar muito
melhor e muito mais rápido do que os pobres. Outra coisa: eu sei cozinhar e
hoje posso trabalhar por conta própria, mas um médico, legalmente, não pode. É
proibido. Não existem clínicas particulares. Mas os médicos não conseguem viver
com o que ganham oficialmente. De modo que quem tem amigos médicos se encontra
informalmente com eles, se consulta, depois dá um presentinho. Cubanos de Miami
vêm e se operam aqui, a um preço muito acessível, mas acabam pagando aos
médicos por fora. Virou uma bagunça”.
Com uma professora aposentada: “O padrão da saúde pública
cubana em Havana não é ruim. No interior, no entanto, é outra conversa. Mas eu
diria que o que é bom mesmo é a formação dos médicos, e os próprios médicos,
muito competentes e humanos. O sistema em si, porém, é arcaico, e está muito
comprometido”.
Com o dono do carro antigo em que dei uma volta de uma hora
por cerca de US$ 35, técnico de indústria açucareira por profissão: “Minha
filha é médica, meus dois sobrinhos são médicos. Ganham bem em relação aos
demais trabalhadores, mas os seus salários não chegam a US$ 70 mensais. Não
conseguiriam viver se não tivéssemos este carro na família. Há uma quantidade
imensa de médicos cubanos pelo mundo, milhares no Brasil, como você sabe. É
bonito isso, mas a consequência é que os médicos que ficam em Cuba acabam
sobrecarregados. Nos plantões em que deveriam trabalhar três médicos, trabalha
um. E este um trabalha por três, mas por um único salário. Sobram médicos
cubanos no mundo, mas faltam médicos cubanos em Cuba”.
Cora não fez críticas e nem sequer se deu conta do que disse,
limitando-se a transcrever opiniões de cubanos. Simplesmente lavou as mãos,
como faz todo cubanófilo arrependido - todos eles ainda sentem um pingo de
saudade, não sei se de Fidel ou da juventude que tinham quando acreditavam nele.
.
Ora, é impossível crer que se tenha uma medicina ao menos
razoável quando há “um problema sério enfrentado por médicos e pacientes [que] é
a falta de material, de suturas a medicamentos e roupa de cama [e] outro [que] é a
corrupção endêmica: há profissionais que desviam produtos dos hospitais e das
clínicas para revendê-los no mercado negro”.
O outro é meio subjetivo, mas também meio óbvio. Todos sabem
que no ensino em Cuba, a maior parte do tempo das aulas é dedicado à
doutrinação política em detrimento das matérias pertinentes, do maternal até o
último ano da faculdade (até os ainda fãs de Cuba admitem isso), portanto, é
lógico afirmar que a competência dos médicos - e outros profissionais -
formados na ilha-presídio é bastante duvidosa. Mas vai saber. De repente eles
usam o vodu ou, quem sabe, um espiritismo mais sofisticado, incorporando os
doutores fritz da vida, para justificar tanto prestígio.
Quanto aos dados estatísticos, só trouxa acredita.
Cá pra nós, é piada!
Ricardo
ResponderExcluirEu recebo o blog cubano 14ymedio, onde também escreve a Yoani Sanchez. Se quiser, posso pedir para que eles enviem também para vc.
Não tem um endereço para acessar o blog?
ExcluirObrigado,Magu. Eu dou uma passada por lá de vez em quando e tenho Yoani no twiter também.
ExcluirMilton
ResponderExcluirMil desculpas. Demorei para ler sua pergunta:
http://www.14ymedio.com/
Concedo-lhe apenas 999 desculpas, para não dizerem que sou frouxo.
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