Em amarelo, as áreas de jazidas |
O primeiro passo para o fim da RENCA
O Ministério de Minas e Energia deu o primeiro passo com
vistas à extinção da RENCA (Reserva Nacional do Cobre) através de portaria
assinada no dia 30 de março de 2017,
quando o ministro Fernando Coelho Filho determinou que os títulos que objetivem
áreas situadas dentro da RENCA e que tenham sido protocolizados no período de
vigência do decreto nº 89.404, de 1984 (que criou a reserva) que estiverem
pendentes de decisão, sejam indeferidos. Por outro lado, ele decide que sejam
mantidos os requerimentos minerários (autorizações de pesquisa, concessões de
lavra, permissões de lavra garimpeira e registros de licença) dentro da área da
RENCA que tenham sido protocolizados antes da promulgação do decreto de criação
da reserva e que estejam regularmente outorgados.
Os processos que tenham sido indeferidos pela autoridade
serão sobrestados até que seja publicado o decreto de extinção da RENCA, o que
já foi solicitado à Presidência da República. Estas áreas deverão ser colocadas
em disponibilidade pelo DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), que
contará com o apoio técnico da CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais,
vinculada ao Ministério de Minas e Energia) para fazer a divisão em módulos que
serão disponibilizados separadamente ou em grupo. Ficam de fora, no entanto, as
áreas dentro da RENCA que tenham sido outorgadas à CPRM.
O objetivo do ministro, ao propor a extinção da RENCA, é estimular
a exploração mineral numa área de pré-cambriano da Amazônia, considerada de
grande potencial e que pode ser revisitada utilizando-se técnicas mais modernas
de pesquisa geológica.
Criação da RENCA
De acordo com depoimento do geólogo Breno Augusto dos
Santos, que vivenciou o processo que levou à criação da RENCA, o interesse pela
área surgiu em 1969, quando a empresa Codim, após a descoberta de Carajás e o
fracasso dos trabalhos na zona do Bacajá, desloca-se para a região Jari-Paru,
onde o geólogo Décio Meyer descobriu o complexo alcalino-ultramáfico do
Maraconaí.
A notícia chegou à Meridional (que descobriu Carajás), a
qual decide sobrevoar toda a Asa Norte, chegando à descoberta do anatásio (um tipo
de mineral) de Maicuru nos anos 1969/1970.
Paralelamente, Décio Meyer trabalha toda a região para a Codim,
atravessando a pé o trecho entre os rios Jarí e Paru, em 1970.
Em 1971/1972, ainda segundo relato de Breno dos Santos, é
criada a Docegeo e Gene Tolbert, que comandava a empresa, decide contratar os
geólogos da Meridional e da Codim, incluindo Décio Meyer. Nessa época a
Meridional e a Codim encerram seus programas de exploração geológica. Em
virtude de sua experiência e o gosto pela região, Décio Meyer fica responsável
pela exploração geológica da Asa Norte. Em 1972, é montado o acampamento no rio
Ipitinga, afluente do Jarí.
Em 1972, o programa RADAM-Brasil, que fazia mapeamento geológico
na Amazônia, decide trabalhar na região e o DNPM solicita à Docegeo apoio ao
RADAM, que convida o geólogo Wilson Scarpelli para prestar assessoria, tendo em
vista seu conhecimento da região de Vila Nova.
A empresa Icomi requer áreas na região Jarí-Paru e, segundo
Breno, a Docegeo e Décio Meyer abandonam a região e seguem para oeste,
requerendo a área de Maicuru. De acordo com Wilson Scarpelli, “como a Icomi
pagou pela cobertura de radar por duas folhas de 1:250.000, as imagens chegaram
primeiro a ela, que identificou as serras e as requereu antes mesmo das imagens
serem entregues ao RADAM. Já há alguns meses eu estava ajudando o RADAM na
interpretação do precambriano do sul do Amazonas. Quando o RADAM recebeu as
folhas do Amapá, convidou a Icomi a coordenar a interpretação dessas duas
folhas. E para isso foi criado um grupo com geólogos da Icomi, CPRM e DNPM, tudo às claras”.
Depois a Icomi decide abandonar a área, que fica livre para
requerimento. Em 1975, Décio e Equipe são transferidos para Carajás. Embora as
áreas do Jarí-Paru estivessem livres, Breno dos Santos afirma que não conseguiu
aprovação da diretoria da Docegeo para voltar à região. “Devido às primeiras
descobertas de cobre, a Docegeo concentra os trabalhos em Carajás. Assim,
apenas é requerido o complexo de Maraconaí”.
Em 1981, Décio Meyer deixa a Docegeo e vai para a BP
(British Petroleum). Dois anos depois, em 1983, ele convence a BP a fazer
requerimentos na região.
Conforme o relato de Breno, “o Almirante Gama e Silva, chefe
do GEBAM (Grupo Executivo do Baixo Amazonas), descobre que Daniel Ludwig, do
Projeto Jarí, tem ações da BP e fantasia que os requerimentos da BP fazem parte
de um plano para o Ludwig dominar a região. O GEBAM tem assento no Conselho de
Segurança Nacional e veta a concessão dos alvarás da BP”.
Em 1984, Gama e Silva liga para Breno, em Belém, informando
que “já havia falado com Eliezer Batista (na época presidente da Vale) e com
Francisco Fonseca (que presidia a Docegeo), para que a área fosse requerida
pela Docegeo. “E que preparasse os pedidos e requeresse logo após o
indeferimento dos pedidos da BP”. Naquele ano as áreas são de fato requeridas
pela Docegeo.
Insatisfeita, a BP recorre ao ministro Delfim Neto e avisa
que se fossem aprovados os alvarás da Vale, ela (BP) entraria com uma ação
contra o governo brasileiro, “por discriminação do capital estrangeiro”.
Gama e Silva liga novamente para Breno dos Santos, narrando
o fato, e pedindo que ele desistisse das áreas. Breno respondeu que somente
faria isso se tivesse autorização superior da Vale. Então solicitou instruções
por escrito à Vale e Docegeo sobre como proceder. Nada conseguiu. O almirante, então,
pediu a criação da RENCA, o que de fato aconteceu em fevereiro de 1984, por
decreto do então presidente João Batista Figueiredo e abrange uma área
considerada de grande potencial nos estados do Pará e Amapá. Pelo decreto, os
trabalhos de pesquisa na área passaram a ser exclusividade da Companhia de
Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), vinculada ao Ministério de Minas e
Energia, usando recursos próprios ou de convênios firmados com o GEBAM (Grupo
Executivo para a Região do Baixo Amazonas).
A outorga de áreas para outras empresas somente poderia ser feita a
empresas que tivessem negociado os resultados dos trabalhos de pesquisa com a
CPRM.
O decreto também estipula que a concessão de áreas na região
pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) somente poderia ser feita
mediante consulta prévia ao Conselho de Segurança Nacional. E preserva as
autorizações e concessões de lavra regularmente outorgadas antes de sua edição.
Em 1994, quando foi secretário de Minas no MME, Breno dos
Santos solicitou às consultorias jurídicas do Ministério e do DNPM que
verificassem a situação legal da RENCA, para ver a possibilidade de acabar com
a mesma. E descobriu, surpreso, que quando a RENCA havia sido criada não tinham
sido indeferidos os pedidos existentes, a maioria em nome da Vale. “Por razões
ética, decidi deixar como estava”, diz.
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