Depois que a pintura perdeu o valor pela arte em si e passou
a valer pelo seu suposto significado - as obras hoje precisam de manuais
explicativos -, passou a valer tudo. Até o Abaporu, atualmente exposto no MASP.
Vai de brinde um dos mil ridículos manuais que servem para “explicar”
essa aberração:
SIGNIFICADO DE ABAPORU, DE TARSILA DO AMARAL
O nome da obra é de origem tupi-guarani e significa “homem
que come gente” (canibal ou antropófago). O título da tela é resultado de uma junção
dos termos aba (homem), pora (gente) e ú (comer).
A tela foi pintada por Tarsila em janeiro de 1928 e
oferecida ao seu marido, o escritor Oswald de Andrade, como um presente de
aniversário. Quando Oswald recebeu a tela ficou imediatamente encantado e disse
disse que aquele era o melhor quadro que Tarsila já havia pintado. Os elementos
que constam na tela, especialmente a inusitada figura ao centro, despertaram em
Oswald a ideia da criação do Movimento Antropofágico.
O Movimento consistia na deglutição da cultura estrangeira,
incorporando-a na realidade brasileira para dar origem a uma nova cultura
transformada, moderna e representativa da nossa cultura.
1. CACTO
O cacto é um elemento característico da flora nordestina e,
portanto, uma imagem empregada simbolicamente para retratar a brasilidade.
Como é uma planta típica de lugares áridos, o cacto é uma
lembrança da seca e da resistência e estabelece um paralelo com o povo
brasileiro, celebrado pela sua capacidade de resiliência.
Vale lembrar que o cacto retratado por Tarsila é, assim como
o chão, verde, uma cor muito cara à identidade nacional devido à sua forte
presença na bandeira.
2. SOL
Símbolo do calor e da energia que propicia a vida, o sol
pintado por Tarsila também impõe condições de trabalho duras aos funcionários
rurais.
Na tela é curioso que a figura do sol seja semelhante à
representação de um olho, que está posicionado acima da figura e do cacto, parecendo
observar a cena.
Na composição da obra, o local escolhido para o sol é de
centralidade e intermédio entre o cacto e o rosto humano. Parece que a luz
emana e permite a vida tanto da flora quanto da fauna.
O amarelo do sol - assim como o azul do céu - está também
presente na cor da bandeira nacional imprimindo à obra mais um traço de
brasilidade.
3. CABEÇA PEQUENA
A cabeça deformada é dos elementos que mais chama a atenção
diante do corpo desproporcional imaginado por Tarsila. Não por acaso, a pintora
nomeou o sujeito como “figura monstruosa”.
Não se consegue distinguir bem as feições da criatura em
questão, por isso não sabemos se se trata de um homem ou de uma mulher.
Sem boca, não é possível interpretar com segurança a
expressão da personagem com cabeça de alfinete, exceto pelo fato de estar com a
face apoiada no braço (seria um sinal de cansaço?).
Alheio(a) ao que se passa ao redor, o rosto também não
apresenta orelhas e se encontra muito próximo do sol. Uma das teorias mais
divulgadas entre os especialistas é que a cabeça pequena é um sinal da condição
da desvalorização do trabalho intelectual no nosso país.
4. PÉ E MÃO ENORMES
O protagonista (ou a protagonista?) escolhida por Tarsila é
uma figura extremamente desproporcional, especialmente se formos comparar as
dimensões da cabeça e dos membros direitos (os membros esquerdos estão
omitidos).
Ele(a) brota da Terra, assentado(a) no chão, assim como o
cacto, mostrando-se intimamente ligado(a) ao solo.
Os pés e as mãos ampliados destacam o sofrimento do
trabalhador brasileiro, a demasiada importância dada à força braçal e ao
trabalho físico em oposição à desvalorização do trabalho intelectual.
Outra leitura possível para o tamanho enorme do pé é o desejo
da pintora sublinhar a conexão do homem com a Terra.
Pra mim a coisa se resume assim: gosto ou não gosto. As demoiselles d"Avignon de Picasso, não gosto; O menino do tambor, dele também, gosto. Esse Abaporu, definitivamente, não gosto.
ResponderExcluirÉ aquela velha história, Marc: gosto não se discute, mas há alguns que são estragados.
ResponderExcluirO mundo anda muito chato! A gente não pode mais ter opinião porque agora há regras para tudo.