Defensor do enfrentamento ao chamado “marxismo cultural”, o
novo ministro da Educação, Abraham Weintraub, diz que ficará vigilante a “tudo
que sair” da pasta, como livros didáticos, e estará atento a “sabotagens”. Ele
nega, porém, que haverá perseguição no MEC. “Não sou caçador de comunistas”,
disse em entrevista exclusiva ao Estado. Ele afirmou que trabalhará para
entregar o que está no plano de governo e não fará, por ora, mudanças no Fies
ou no Prouni. “Chega de solavanco.”
Tema do programa de Bolsonaro, a disciplina nas escolas é
alvo de preocupação. Ele defende que professores agredidos em sala de aula
chamem a polícia e que os pais sejam processados e, “no limite”, percam o Bolsa
Família e a tutela das crianças infratoras. “Temos de cumprir leis ou
caminhamos para barbárie. Hoje, há muito o ‘deixa disso’, ‘coitado’. O coitado
está agredindo o professor”, disse, frisando que ainda não há medidas previstas
para enfrentar o problema.
Weintraub diz que o cronograma do Enem será cumprido e que
Bolsonaro não lerá previamente as questões da prova. “Se sair um Enem todo
errado, sou o culpado e tem de me dar reprimenda ou me tirar do cargo.”
O que o presidente Jair Bolsonaro disse ao senhor ao
convidá-lo para assumir o MEC?
Disse que me considerava o mais preparado dentre os que
tinham surgido como possibilidade para o cargo, que me conhecia, que via que eu
tinha envolvimento com a área, sendo professor de universidade federal, tendo
formação acadêmica.
O que ele pediu ao senhor?
Para entregar resultado, gestão. Fazer com que as coisas
sejam cumpridas de acordo com o plano de governo. Como estava na secretaria
executiva e pelo meu perfil, talvez fosse um coringa para muitas áreas, pela
minha característica de gestão. No caso da educação, tenho experiência como
professor. Sou uma pessoa que tem fé. Mas a fé no lugar da fé e a razão no
lugar da razão. Para analisar se tenho condição ou não de assumir algo, vou
olhar a história. Será que as pessoas que passaram pelo MEC tinham mais ou
menos condições do que eu? Estamos falando de uma coisa séria, um ministério
importantíssimo, milhões de pessoas serão afetadas.
Como o senhor fez essa análise?
Fiz essa planilha (mostra uma lista no laptop). Foram 11
ministros da Educação em 16 anos. Tirando Fernando Haddad, duraram, em média,
menos de um ano no cargo. O perfil: 73% eram professores e todos
universitários. Pergunto: desses, quantos deram mais tempo de aula do que eu ou
lecionaram em universidades com mais renome que a Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp, onde Weintraub dava aulas)? A tabela mostra que tenho
qualificação adequada. Outro ponto: dos 11 listados, 64% tinham filiação
partidária. Tenho posição ideológica, mas não sou partidário. Não estou aqui
numa trajetória política de longo prazo, o que faz de mim uma pessoa puramente
técnica. Quantos desses já foram gestores de um carrinho de pipoca? Minha
cabeça é da iniciativa privada.
Sua indicação é uma vitória de Onyx Lorenzoni ou de Olavo de
Carvalho?
Meu nome surgiu na viagem a Israel. Onyx ficou sabendo
apenas depois. Eu falei para ele que meu nome estava sendo cogitado e ele tomou
um susto.
É uma vitória de Olavo de Carvalho então?
O presidente Jair Bolsonaro é uma bandeira. Atrás dessa
bandeira, há vários grupos: monarquistas, militares, evangélicos, liberais e
olavistas.
O senhor não é olavista?
Não estou nesse grupo, mas gosto de muitas ideias dele. São
disruptivas, ideias novas e criativas e com grau de acerto para entender a
realidade. Ele é um cara muito inteligente. Falar que ele não tem papel grande
na mudança de pensamento que houve no Brasil é uma loucura. Foi um cara que
influenciou muito. Ele tem ótimas ideias, mas não concordo com tudo.
E se Olavo criticar uma escolha do senhor para o MEC?
Paciência... Posso sempre escutar. Escuto todo mundo, até
quem me crítica . Não senti pressão nenhuma até agora. O presidente me deu
carta branca para formar o time. Ele me pediu só para entregar tecnicamente os
melhores resultados. E esse é meu histórico. Não estou lá para fazer barulho,
destruir, fazer coisas erradas.
Quem o senhor vai levar?
Já estou levantando e vou divulgar em breve. Já sei algumas
pessoas que vou tirar. Vou colocar técnicos e gestores no lugar. Estamos
buscando no curto prazo entregar os números, o resultado. Temos o compromisso
não só com o grupo que nos elegeu. Temos de governar para todos. E isso envolve
fazer provas, as coisas chegarem na hora certa, e no preço. Não existe ensino
público gratuito. Quem custeia é o pagador de imposto. Temos de olhar como
relação cliente e fornecedor de serviço. O meu cliente é a população, o cidadão
pagador de imposto. Essa visão não me impede de ter posição ideológica
totalmente alinhada com todos esses grupos. Nunca briguei com nenhum deles.
Concordo.
Concorda em quê?
A violência é um problema do Brasil? É. E ela é única e
exclusivamente porque há pobres do Brasil? Não. Tem país mais pobre que não é
tão violento. Tem muito a ver com uma cultura de louvar o criminoso. Você
acredita que a Bíblia é um bom livro? Acho. Um dos melhores livros que você tem
no mundo ocidental. Mesmo o ateu deve ler a Bíblia para ter conhecimento
filosófico e histórico. E você acha que Olavo é inteligente? Muito inteligente
e tem muito a agregar. E você vai obedecer a tudo que o Olavo disser? Não, não
vou.
Qual o principal problema a ser enfrentado na Educação?
Há várias coisas da agenda com atraso no cronograma. Foi por
isso que Vélez saiu. Ele não saiu porque foi pego num escândalo, porque é
pessoa má ou sem capacidade intelectual. Ele saiu porque no cronograma de
entregas há uma série de atrasos. E isso significa que o presidente está
fazendo a gestão de seus 22 executivos de forma bem empresarial.
O senhor defende o enfrentamento do chamado “marxismo
cultural”. Como propõe fazer isso?
No curto prazo, tomando cuidado com tudo o que vai sair do
MEC, como livros didáticos. Vou te dar um exemplo que está bem documentado:
quando chegamos aqui na Casa Civil começamos a dialogar com os caminhoneiros.
Lá pelas tantas, dois infiltrados soltaram um comunicado dizendo que
caminhoneiro era sem vergonha. Era sabotagem. Eles foram desligados. Ainda tem
gente que vai sabotar. Estamos preocupados com vazamentos, com sabotagens. Mas
não estou indo lá caçar ninguém. Não sou caçador de comunistas. Não gosto do
comunismo, mas aceito o comunista. Quero a redenção dele.
O que isso quer dizer? O comunista tem de se converter?
Quero convencê-lo pela lógica, pelas evidências. A pessoa
não é má pura e simplesmente. Ela está envolvida numa mentira e aquilo é uma
realidade para ela. Ela se mexe pela causa. Meu avô foi para campo de concentração.
E como ele escapou? Tinha um sargento da SS (tropa nazista) que protegia ele
dentro do campo e o salvou. O cara falou: isso aqui é loucura. Meu avô foi
parar no campo com 14 anos. O cara estava dentro de um contexto. A gente
precisa explicar que é uma ideologia errada essa (a do comunismo). Você nunca
vai escutar de mim - ou de pessoas próximas a mim - falar em matar. A gente não
fala em matar, falamos em confrontar com força, mas ideologicamente,
verbalmente. Com conversa. Não quero matar ninguém. Evidentemente, se a pessoa
vem me matar eu tenho direito de me defender.
Circulou um vídeo no qual o senhor dizia: “Os comunistas
estão no topo do País, são o topo das organizações financeiras, são donos dos
jornais, são os donos das grandes empresas...” Qual a definição de comunista
para o senhor?
Eu estava num fórum conservador. É preciso analisar o
contexto no qual eu estava falando. Não quero me alongar muito, mas o Brasil
vive o contexto de uma distopia do George Orwell. Você pega o livro Revolução
dos Bichos. Ao fim, porcos e fazendeiros estão juntos fazendo negócios juntos e
explorando outros animais, que são o povo. O que temos visivelmente é que
alguns grandes conglomerados fizeram uma aliança com os partidos ditos de
esquerda – não é uma boa definição direita e esquerda, prefiro muito mais a
definição a favor de liberdade do indivíduo e da família versus o totalitário e
coletivista.
Em uma palestra, o senhor falou do risco de o PT voltar e
disse que o “inimigo é igual ou mais forte senão sou trouxa”. A estratégia de
impedir a volta do PT, do inimigo, passa pela Educação?
Sem dúvida. Uma pessoa que sabe ler e escrever e tem acesso
à internet não vota no PT. A matemática
é inimiga do obscurantismo. Eu não sou contra o petista. Tenho amigos que são
petistas. Pessoas boas que não conseguem se livrar. Eu converso com as pessoas.
Não é que eu tenho: “ah, demônio!” Agora, sou contra o obscurantismo.
Como esse enfrentamento ao PT passa pelo Ministério da
Educação?
Mais do que termos um livro que diga a história, precisamos
de uma versão que considero mais correta. Porque houve uma desconstrução da
história do Brasil. A gente teve grandes heróis. Esse “nunca antes na história
do Brasil” é muito nefasto. A gente teve figuras fantásticas. O Brasil é um dos
poucos países do mundo em que você não teve “founding fathers”, mas “founding
mothers”: Anita Garibaldi, Princesa Isabel, Dona Leopoldina. Você teve figuras
como Jose Bonifácio, irmãos Rebouças.
Mas o que isso tem a ver com a questão do PT?
Não queria falar do PT. Esse movimento totalitarista
obscurantista busca destruir a história. Se você não conhece a história e de
onde você veio, não se conhece. E, quando não se conhece, não tem tanta
convicção de lutar pelo que é certo.
Isso envolve rever a ditadura militar nos livros didáticos?
O momento é de entregar resultado. Não quero entrar nessa
discussão agora. Evidentemente que houve ruptura em 1964. Mas essa ruptura foi
dentro de regras. Houve excessos? Houve. Pessoas que morreram? Sim. É errado? É
e infelizmente ocorreu. Mas num dia de protesto na Venezuela morreu mais gente
do que em todo o período de regime.
Mas ditadura ruim então é do outro?
Não disse isso. Acho que as coisas têm de ser
contextualizadas. Quando contextualizo mostro que, em determinados momentos,
evidentemente que houve erros (no regime militar no Brasil). Mas, se olhar o
que gerou a ruptura, foi um movimento de esquerda e houve então uma
contrarrevolução. Isso está muito bem documentado. E tem que ser escrito e
dito. Por que não? Quando comparamos o que houve no Brasil com qualquer outra
alternativa da América Latina não concordo de chamar de ditadura. Houve um
regime de exceção.
Há problemas graves de aprendizagem nas escolas. Nossa
prioridade é combater o “marxismo cultural”?
Quem é o patriarca da educação moderna brasileira? Paulo
Freire. Há quanto tempo estamos falando de Paulo Freire no Brasil? Deu certo? O
Brasil gasta como países ricos em termos de PIB (Produto Interno Bruto) e
nossos indicadores estão muito abaixo da média.
Mas isso ocorre por causa de Paulo Freire?
Falar que é uma explicação única seria burrice. Deixa eu
sentar lá e consertar a fiação, religar a luz, colocar as coisas para rodar.
Cada dia sua agonia.
O senhor manterá o decreto que estabelece o método fônico na
alfabetização?
Estou fechando o time e gostaria de ter a opinião da pessoa
para a área. Sou gestor. Escolherei os executivos e eles vão encaminhar. O
método fônico não estava no plano de governo. Sinto-me à vontade para mudar se
for o caso. O que está no plano de governo nós vamos entregar.
A Base Nacional Comum Curricular será modificada ou acabará?
Vamos modificar. Não acabar. O plano de governo não diz em
acabar com ela. Gente, vamos deixar claro: chega de solavanco.
O programa de governo fala do problema da disciplina das
escolas. Quais são as medidas para enfrentar a questão?
No curto prazo, não faremos nada nesse aspecto. Mas sou a
favor de seguir a lei. Se o aluno agride, o professor tem de fazer boletim de
ocorrência. Chama a polícia, os pais vão ser processados e, no limite, tem que
tirar o Bolsa Família dos pais e até a tutela do filho. A gente não tem que
inventar a roda. Tem que cumprir a Constituição e as leis ou caminhamos para a
barbárie. Hoje há muito o “deixa disso”, “coitado”. O coitado está agredindo o
professor. Tem que registrar, o pai tem que ser punido. Se não corrigir, tira a
tutela da criança. Se o professor alega que ele não tem apoio do Estado, um
recado: o Estado somos nós. Se o professor alegar que não tem apoio do Estado,
um recado: o Estado somos nós. “Ah, mas é o PCC (Primeiro Comando da Capital)
que está fazendo.” Tem que chamar prefeito, secretário de Educação e enfrentar
o problema. Não tem que sentar e achar que nunca vai mudar.
Já há plano para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica (Fundeb), que vence em 2020?
O tema está em cima de minha mesa. Está em análise.
A gráfica do Enem faliu. O cronograma será mantido?
A população não tem que ficar sendo alarmada enquanto a
gente acha que consegue entregar no prazo. Vamos resolver. Não estamos
trabalhando com mudança do cronograma.
Bolsonaro verá as questões do Enem previamente?
Ele não me pediu isso.
E se o presidente pedir?
Falarei que garanto que não haverá nenhum problema. Se sair
um Enem todo errado, todo torto, sou o culpado e o presidente tem de me dar
reprimenda ou me tirar do cargo. É assim que funciona. O presidente tem 22
ministros. Ele sentiu que havia um problema no MEC e se deslocou para essa
área. Mas não deveria perder tempo vendo questões do Enem.
Será mantida a comissão criada para fazer um pente-fino nas
questões do Enem?
A princípio, não. De modo geral, não gosto de comitês e
comissões. Minha visão é que tem de ter
responsáveis. Ele tem equipe, ele resolve, ele me entrega. Eu delego. Se sentir
que não está indo bem, chego junto. O MEC é um mundo. Mais de R$ 120 bilhões de
orçamento. Uma fortuna. Assuntos complexos. É gigantesco. Precisa ser visto sob
o prisma de gestão.
Como ficará o Conselho Nacional de Educação?
Não gosto de conselho, mas acho pertinente chamar pessoas
que têm experiência na área e escutá-las. Você escutaria o Instituto Ayrton
Senna? Com certeza. Selecionar alguns nomes de pessoas com trânsito que poderão
aconselhar. Acho muito pertinente. Estamos entrando para operacionalizar. Você
tem sua linha ideológica, mas você não está governando só para os seus. Tem de
ouvir outros lados também.
Qual o plano do senhor para as universidades federais?
O Brasil gasta muito e a produção científica com resultados
objetivos para a população é baixa. O Brasil é um país de renda média que tem
necessidades essenciais. Precisamos escolher melhor nossas prioridades porque
nossos recursos são escassos. Não sou contra estudar filosofia, gosto de
estudar filosofia. Mas imagina uma família de agricultores que o filho entrou
na faculdade e, quatro anos depois, volta com título de antropólogo? Acho que
ele traria mais bem-estar para ele e para a comunidade se fosse veterinário,
dentista, professor, médico. O Japão direcionou recursos públicos para coisas
mais objetivas e materiais.
O senhor fala em bolsas focadas em áreas exatas ou em fechar
cursos da área de humanas?
Fechar nada. Gente: sem sangue. Tudo será feito dentro da
lei, dentro da Constituição, respeitando integralmente todos os direitos das
pessoas.
O senhor pretende respeitar o primeiro colocado na lista
tríplice para o cargo de reitor das universidades?
Está dentro da lei?
O senhor pode escolher qualquer um dentro da lista.
Perfeito. Está respondido. Vou escolher dentro do que eu
achar mais conveniente. Dentro da lei. Uma observação: quem paga as
universidades federais são os pagadores de impostos. É o agricultor, o
motorista de ônibus. Nós todos morando no Brasil. Quando vão na universidade
federal fazer festa, arruaça, não ter aula ou fazer seminários absurdos e
abjetos que agregam nada à sociedade é dinheiro suado que está sendo
desperdiçado num país com 60 mil homicídios por ano e mil carências. Não é
criminoso, mas é muito errado.
Qual opinião do senhor sobre a política de cotas?
No curto prazo, não vou mexer em nada disso. Na Unifesp, o
ambiente é muito bom com cotas. Talvez para aquela pessoa que fica de fora no
desempate seja uma injustiça, mas esse não seria o primeiro problema a atacar.
Qual o plano do senhor para Prouni e Fies?
Tem que manter. No curto prazo, a gente não pode bagunçar
muito. Estamos mexendo com a vida das pessoas. Temos de fazer movimentos que
não impactem de forma dura e negativa. O pagador de impostos tem de ser
respeitado.
A Lava Jato da educação existe? O senhor tocará?
Qualquer indício de crime mandarei para o Ministério
Público.
Qual sua opinião sobre o Escola Sem Partido?
Não tenho opinião formada. Sou contra qualquer discussão
política até o ensino secundário.
Mas há evidências de doutrinação nas salas de aula?
Sou a favor de acompanhamento, de estatística. Queria mudar
o foco. Deveria ter exames nacionais para a gente ver como está sendo o
aprendizado naquele grupo trimestralmente e poder acompanhar a evolução para
saber se aquele professor está tendo bom desempenho. Hoje não sabemos como é o
desempenho do professor e a gente o mantém. Qual a troca de professores que a gente
tem por ano? Em qualquer atividade há maus profissionais. Deveríamos ter uma
política para tirar profissionais de baixo desempenho senão quem paga é a
criança e o pagador de imposto.
Mas e a política de formação de professores?
Mesmo que tenha ótima formação, vai ter um grupo de
profissionais que não vai render. Ou 100% serão bons professores? Se
verificarmos que aquela classe está indo bem em ciências, humanidades, que sabe
responder perguntas que estão vindo nacionalmente... Então, deixa o cara trabalhar.
Deixa ela em paz. Essa é minha visão. A gente tem que entregar resultado.
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