Como se pode ver, lá como cá a justiça é a lesma lerda. Aliás,
perdão: lesma lerda é aqui, lá é lesma rápida...
Por João Ozorio de Melo
Embora tomates sejam frutas, em caso tributário, em 1893
Suprema Corte dos EUA definiu que eles são vegetais.
Com doses de maldade, um artigo indica que os ministros são
“alérgicos” a matemática, o que não recomenda apostas em um dos casos da pauta.
Outro, que são avessos a estatísticas e podem se basear em dados falsos quando
fazem levantamentos por conta própria. E outro mais, que a lógica dos ministros
algumas vezes é surpreendente.
Para comprovar que as decisões da corte às vezes contrariam
o que se pensa que é a lógica, o jornal The Washington Post desenterrou uma
decisão do século XIX. Em 1893, a Suprema Corte decidiu que tomate é um
vegetal, e não uma fruta, como ensinam a Botânica e os professores na escola.
Naquela época, havia uma diferença significativa entre
vegetais e frutas, não por causa da botânica, mas por causa da “receita
federal”. O governo tributava a importação de vegetais em 10%, mas não
tributava a importação de frutas. Assim, o governo quis coletar impostos da
atacadista de Manhattan John Nix & Co, que importava tomate em grandes
quantidades.
Em 1887, John Nix e sócios (familiares) moveram uma ação
contra o então diretor da Alfândega no porto de Nova York, Edward Hedden,
procurando “recuperar impostos pagos sob protestos” e parar de pagá-los. Seis
anos mais tarde, o processo chegou à Suprema Corte (caso Nix v. Hedden).
Em sua defesa, os autores da ação citaram três dicionários
(Webster’s, Worcester’s e Imperial) e apresentaram duas testemunhas
especializadas, para provar que tomate é uma fruta. Os ministros não
contestaram a botânica, mas decidiram que tomate é um vegetal assim mesmo.
Existia uma lógica por trás da vegetalidade do tomate :
“Botanicamente falando, tomates são frutos de uma parreira,
tais como pepinos, abóboras, feijão e ervilhas. Mas na linguagem comum das
pessoas, sejam vendedores ou consumidores dos mantimentos, todos esses são
vegetais, que crescem nas hortas e que, quer sejam cozidos ou crus, como
batatas, cenouras, pastinacas, nabos, beterrabas, couve-flor, repolho, aipo e
alface, são todos servidos no jantar ou depois da sopa com peixe ou carnes, o
que constitui a parte principal da refeição e não como sobremesa como é o caso
das frutas”.
“Tomates, tal como nozes, podem ser classificado como
sementes [o fruto da planta], mas não no comércio e na linguagem popular. (...)
Como um artigo de alimentação em nossas mesas, sejam assados ou cozidos ou
formando a base da sopa, eles são usados como vegetais, maduros ou verdes. Esse
é seu principal uso”.
Essa foi uma tese que, apesar de surpreendente por
contrariar a botânica e os dicionários, coincidiu com a lógica popular.
Dizia-se na época, a propósito da discussão na Justiça, que se tomate fosse uma
fruta, estaria na feira e nos mercados entre as outras frutas, não entre os
vegetais, como sempre está.
A decisão teve algumas repercussões na sociedade. Com base
na decisão da corte, a alfândega, a Liga das Nações e o Departamento de
Agricultura dos EUA classificaram o tomate como vegetal. Nova Jersey declarou o
tomate o vegetal do estado. Mas não houve unanimidade. Por exemplo, Tennessee e
Ohio declararam o tomate a fruta do estado.
Tal decisão poderia ser aceita em muitos países, no caso do
tomate. Mas haveria controversas, se o objeto da discussão fosse o abacate. Nos
EUA e em países hispânicos, o abacate pode ser visto como um vegetal. Afinal,
com ele se fazer pratos salgados, muito apreciados nesses países, como o
guacamole, o aguacate, saladas e salsas. Mas, no Brasil, abacate é mesmo uma
fruta na botânica e no uso popular mais comum.
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