Ana Paula Henkel
Não deveria me incomodar com um prêmio que já foi dado a
Adolf Hitler, Vladmir Putin, Aiatolá Khomeini, Barack Obama e duas vezes a
Josef Stálin, mas a revista TIME este ano resolveu esbofetear todas as mulheres
que, como eu, tiveram que enfrentar dificuldades incalculáveis na vida por não
aceitarem assédio ou trocarem carícias por fama e fortuna.
Exageros à parte, quem recusa o teste do sofá paga um preço,
quem aceita sobe mais rápido. Fato. Ser ético e profissional, ter valores e
princípios morais dados pela família e não por novela ou blogueiro lacrador,
honrar pai e mãe, optar pelo bom, verdadeiro e justo sem atalhos ou concessões
degradantes, pode ser um “teto de vidro” profissional e pessoal para quem se dá
ao respeito. Se não houver violência ou coerção, é opção. Acertado não é caro.
Não me refiro às mulheres selecionadas pela TIME, mas é
preciso dizer que todos que cedem a assediadores voluntariamente para acelerar
o sucesso e engordar a conta bancária não me representam. As apressadas também
não fazem jus a milhões de mulheres que se matam de trabalhar todos os dias,
que fazem dupla jornada, que precisam ser mães, companheiras, filhas, irmãs,
amigas, funcionárias, chefes, e mesmo assim não vão para a cama com o inimigo.
Perdoem meu francês, mas como respeitar uma mulher que desce
a roupa para subir mais rápido na vida e depois de conquistar todo dinheiro e
sucesso vem posar de porta-voz contra o assédio e a violência sexual? Quantas
mulheres tão ou mais talentosas e aptas abriram mão de estar no topo para
manter a própria dignidade? Quantas de nós tiveram vidas de entrega, sacrifício
e puro altruísmo, que transformaram o mundo num lugar melhor sem lucrar nada
com isso? Façam-me o favor!
Por mais que me esforce, nunca chegarei aos pés do heroísmo
de Haley Batista, a professora que morreu há dois meses lutando contra um
psicopata e com 90% do corpo queimado para salvar crianças que nem eram suas
parentes, deixando seu bebê de um ano órfão. Onde estão as homenagens a seu
exemplo e à sua memória? No dia que uma destas feministas de butique vier pedir
minha piedade, mostrarei para ela a foto de Haley, esta sim a Mulher do Ano. Que
o céu receba sua alma em festa.
Por mais que tente, nunca chegarei perto da alma heroica de
Kayla Mueller, uma médica voluntária americana que foi capturada pelo Estado
Islâmico na Síria e que foi mantida refém e estuprada constantemente no
cativeiro. Antes de ser morta, Kayla tentou proteger várias outras mulheres de
se tornarem escravas sexuais. Por que Kayla nunca foi capa da TIME?
Há algo de errado num mundo que aplaude desqualificadas que
ficam ricas e famosas sabe-se lá como enquanto Haley Batista e Kayla Mueller
viram notas de pé de páginas na história. Herói é quem coloca em risco sua
própria segurança, seu patrimônio e sua vida para ajudar o próximo, não quem
lucra numa troca de favores inconfessáveis e anos mais tarde, milhões e milhões
na conta bancária depois, resolve, em outra jogada de marketing, faturar ainda
mais com o vitimismo. Esse falso holofote não joga luz no verdadeiro problema
do assédio.
Antes que os assassinos de reputações apareçam distorcendo
esse texto, é bom deixar bem claro: os vilões dessas histórias de assédio são
evidentemente os assediadores, mas quem topa voluntariamente trocar sexo por
uma promoção ou um caminho mais curto para a fama não merece prêmios pelo
simples motivo de que muitas mulheres, na mesma situação, recusaram a oferta.
Outras ainda denunciaram seus agressores, correndo todo tipo de risco para que
estes monstros não cometessem mais crimes e fizessem mais vítimas. São elas que
merecem meu respeito e minhas homenagens. Acredite, sei do que estou falando, o
caminho mais longo e sem “atalhos” para o sucesso é demorado mas é também
libertador.
Muitas atrizes de Hollywood que hoje são festejadas como
“quebradoras do silêncio” passaram anos numa bizarra mudez alimentando uma
perturbadora cumplicidade que acabou protegendo predadores sexuais. Enquanto
roteiros de filmes eram trocados e fotos no tapete vermelho com vestidos de
grife eram tiradas, outras mulheres sem a mesma projeção que as empoderadas de
Hollywood eram vítimas de estupros e assédio sexual. Por que demoraram tantos
anos para se tornarem “a voz das mulheres”?
Não me peçam para reverenciar atuações de mulheres poderosas
e milionárias que davam belos discursos com os olhos marejados sobre o assédio
e a violência contra a mulher enquanto fingiam não saber quem eram os
predadores, alguns deles na platéia como Harvey Weinstein. Não julgo nem
condeno, cada um sabe de si, mas também não me peçam para aplaudir celebridades
consagradas que escolheram se calar por anos e anos contra os algozes de quem
não tinha a mesma voz.
Assim como nas telas, estas celebridades foram atrizes
também na vida real, escondendo uma verdade inconveniente para blindar uma vida
de festas, glamour, dinheiro e mentiras. Hipocrisia e atuações dignas de um
Oscar.
Talvez este seja o único comentario para a Ana Paula Henkel que retratou com fidelidade do comportamento de mulheres famosas que tiveram que abdicar de seus principios éticos e morais para chegarem ao topo da gloria mais depressa, que aquelas que ralaram anos a fio para chegarem tambem ao topo, mas que não abdicaram de seus principios. \\\\\\\\Para elas a homenagem de um ancião que ainda acredita que nossos principios morais estão acima de tudo, sem o que não valeria a pena viver.
ResponderExcluirMagu disse: Poizé! Só para lembrar, que um idoso lembra de coisas mais para trás, em uma das confissões da famosa Brigite Bardot, ela contou que a coisa mais incomodativa para futuras estrelas, era fazer chupeta em produtor idoso para conseguir papéis mais importantes...
ResponderExcluirPois é, Magu. Isso é público e notório. Por aqui, nos idos de 70, ficou famosa a expressão "teste do sofá", experiência pela qual passaram muitas meninas, hoje estrelas globais. Daniel Filho que o diga...
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