segunda-feira, 18 de abril de 2016

O Brasil surreal agora tem dois presidentes e nenhum governa, “graças” ao STF! São umas gracinhas mesmo...

Carlos Newton: Supremo instituiu vácuo administrativo e o país agora tem dois presidentes

Ao legislar sobre o rito do impeachment da presidente Dilma Rousseff, por obra e graça do criativo ministro Luís Roberto Barroso, o Supremo Tribunal Federal inventou que o Senado teria o direito de aprovar ou rejeitar liminarmente a decisão da Câmara, circunstância existente na legislação. Com isso, o Supremo simplesmente instituiu um vácuo administrativo que a legislação referente ao impeachment (Lei 1079) sabiamente tentou evitar, ao estabelecer o imediato afastamento de presidente da República ou ministro de Estado, logo após de encerrada a votação da Câmara, cuja Mesa Diretora então edita o chamado “decreto de acusação”.

O artigo 23 da Lei do Impeachment não deixa margem a dúvidas, ao determinar que “são efeitos imediatos ao decreto da acusação do Presidente da República, ou de Ministro de Estado, a suspensão do exercício das funções do acusado e da metade do subsídio ou do vencimento, até sentença final” (parágrafo 5º).

E o parágrafo 6º estabelece a etapa seguinte: “Conforme se trate da acusação de crime comum ou de responsabilidade, o processo será enviado ao Supremo Tribunal Federal ou ao Senado Federal”.

Como se constata, a Mesa da Câmara simplesmente esqueceu o parágrafo 5º (afastamento de Dilma) e seguiu direto para o parágrafo 6º (comunicação ao Senado). Na verdade, a esculhambação institucional e jurídica incentivada pelo Supremo é de tal ordem que agora se conseguiu criar uma situação esdrúxula e altamente perigosa, porque a Mesa da Câmara ficou temerosa de cumprir a lei e não intimou a presidente da República, desrespeitando o que está determinado na Lei 1079.

Com esta aberração criada sob coordenação do ministro Luís Roberto Barroso, com a conivência da maioria dos ministros, à exceção de Dias Toffoli e Gilmar Mendes, o país acordou hoje com dois ocupantes da Presidência da República – a petista Dilma Rousseff, que já tem contra ela o decreto de acusação que a obrigaria a se afastar, e o peemedebista Michel Temer, vice-presidente que já deveria estar em exercício, mas está impedido de assumir pelo Supremo.

Parece brincadeira, mas é a realidade do surrealismo que caracteriza o Brasil. Por enquanto, a ainda presidente Dilma Rousseff pode voltar ao Palácio do Planalto e despachar normalmente, nomear ministros, autorizar despesas, demitir autoridades ligadas aos “traidores”, fazer o que bem entender.

E o vice-presidente Michel Temer fica completamente manietado, sem poder governar, como se fosse uma espécie de refém institucional. Enquanto o Senado não confirmar o afastamento de Dilma, o vice Temer não pode nem pisar no Planalto, vejam bem a absurda irresponsabilidade do Supremo e a inaceitável leniência da Câmara, que deveria simplesmente ter cumprido a Lei do Impeachment, que continua em vigor, e afastado Dilma Rousseff da Presidência, mediante o decreto de acusação. Se depois o Senado quisesse anular o processo e reintegrar Dilma, o problema não é da Câmara.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, é conivente com esta situação e não quer briga com o Supremo, que tem o hábito de deixar prescrever os crimes contra ele. Ao invés de reunir logo os senadores e votar se Dilma poderá ser julgada ou não, pondo fim ao vácuo administrativo, ele vai cumprir o rito antigo, ao estilo de Martinho da Vila, devagar, devagarinho…

A leitura da decisão da Câmara somente será feita pela Mesa do Senado nesta terça-feira, dia 19. Se estiverem a fim, os senadores podem formar a chapa e eleger logo a Comissão Especial do Impeachment, mas tudo indica que ainda haverá negociações e debates, com transmissão ao vivo pela TV. e político gosta mesmo é de holofotes.

Bem, depois de formada e instalada, a Comissão elegerá seu presidente e o relator, que terá prazo de dez dias para estudar o assunto e emitir seu parecer, sendo entrevistado várias vezes, diariamente, sobre a denúncia. A etapa seguinte será a votação do parecer pela Comissão. Seja qual for o resultado, será depois submetido ao plenário, que finalmente então decidirá se a presidente Dilma responderá a processo ou não.

Por fim, é bom lembrar que todo esse ritual pode ser bagunçado pelos senadores do PT, pedindo vistas, levantando questões de ordem e tudo o mais, Ou seja, o país vai ficar longo tempo com uma presidente-zumbi sentada no Planalto, até desencarnar totalmente, vejam a situação surrealista criada pelo Supremo, ao dar pitacos em assuntos que só dizem respeito ao Congresso, desrespeitando a indispensável independência dos Poderes da República. Mas quem se importa?


6 comentários:

  1. Mais uma vez vou citar o Gabriel Garcia Marquez: "Na américa latina, tudo é muito lento, uma semana pode demorar décadas". Quanto tempo pode demorar o IMEDIATAMENTE?

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  2. (argento) ... em minha "santa inguinoranssa", começo a achar que estamos sob Golpe; não o que a prisidanta alega estar sofrendo, mas algo como um "plano B", engendrado sob os auspícios do PC - quero estar errado ...

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    1. Em minha humilde arrogância, também considero que estamos sob golpe, a questão é: qual golpe será o vencedor?

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  3. Se demorar mais um pouco esse hiato para ocupar a pres. da república o povo vai perceber que esse cargo só atrapalha e não faz falta nenhuma rsrsrs....

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  4. Concordo.

    Escrevi a respeito em http://www.marcelobessa.com.br/2016/04/por-que-demora-no-senado.html?m=1

    Parabéns pelos seus textos.

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