Carlos Newton: Supremo instituiu vácuo administrativo e o
país agora tem dois presidentes
Ao legislar sobre o rito do impeachment da presidente Dilma
Rousseff, por obra e graça do criativo ministro Luís Roberto Barroso, o Supremo
Tribunal Federal inventou que o Senado teria o direito de aprovar ou rejeitar
liminarmente a decisão da Câmara, circunstância existente na legislação. Com
isso, o Supremo simplesmente instituiu um vácuo administrativo que a legislação
referente ao impeachment (Lei 1079) sabiamente tentou evitar, ao estabelecer o
imediato afastamento de presidente da República ou ministro de Estado, logo
após de encerrada a votação da Câmara, cuja Mesa Diretora então edita o chamado
“decreto de acusação”.
O artigo 23 da Lei do Impeachment não deixa margem a
dúvidas, ao determinar que “são efeitos imediatos ao decreto da acusação do
Presidente da República, ou de Ministro de Estado, a suspensão do exercício das
funções do acusado e da metade do subsídio ou do vencimento, até sentença
final” (parágrafo 5º).
E o parágrafo 6º estabelece a etapa seguinte: “Conforme se
trate da acusação de crime comum ou de responsabilidade, o processo será
enviado ao Supremo Tribunal Federal ou ao Senado Federal”.
Como se constata, a Mesa da Câmara simplesmente esqueceu o
parágrafo 5º (afastamento de Dilma) e seguiu direto para o parágrafo 6º
(comunicação ao Senado). Na verdade, a esculhambação institucional e jurídica
incentivada pelo Supremo é de tal ordem que agora se conseguiu criar uma
situação esdrúxula e altamente perigosa, porque a Mesa da Câmara ficou temerosa
de cumprir a lei e não intimou a presidente da República, desrespeitando o que
está determinado na Lei 1079.
Com esta aberração criada sob coordenação do ministro Luís
Roberto Barroso, com a conivência da maioria dos ministros, à exceção de Dias
Toffoli e Gilmar Mendes, o país acordou hoje com dois ocupantes da Presidência
da República – a petista Dilma Rousseff, que já tem contra ela o decreto de
acusação que a obrigaria a se afastar, e o peemedebista Michel Temer,
vice-presidente que já deveria estar em exercício, mas está impedido de assumir
pelo Supremo.
Parece brincadeira, mas é a realidade do surrealismo que
caracteriza o Brasil. Por enquanto, a ainda presidente Dilma Rousseff pode
voltar ao Palácio do Planalto e despachar normalmente, nomear ministros,
autorizar despesas, demitir autoridades ligadas aos “traidores”, fazer o que
bem entender.
E o vice-presidente Michel Temer fica completamente
manietado, sem poder governar, como se fosse uma espécie de refém
institucional. Enquanto o Senado não confirmar o afastamento de Dilma, o vice Temer
não pode nem pisar no Planalto, vejam bem a absurda irresponsabilidade do
Supremo e a inaceitável leniência da Câmara, que deveria simplesmente ter
cumprido a Lei do Impeachment, que continua em vigor, e afastado Dilma Rousseff
da Presidência, mediante o decreto de acusação. Se depois o Senado quisesse
anular o processo e reintegrar Dilma, o problema não é da Câmara.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, é conivente com
esta situação e não quer briga com o Supremo, que tem o hábito de deixar
prescrever os crimes contra ele. Ao invés de reunir logo os senadores e votar
se Dilma poderá ser julgada ou não, pondo fim ao vácuo administrativo, ele vai
cumprir o rito antigo, ao estilo de Martinho da Vila, devagar, devagarinho…
A leitura da decisão da Câmara somente será feita pela Mesa
do Senado nesta terça-feira, dia 19. Se estiverem a fim, os senadores podem
formar a chapa e eleger logo a Comissão Especial do Impeachment, mas tudo
indica que ainda haverá negociações e debates, com transmissão ao vivo pela TV.
e político gosta mesmo é de holofotes.
Bem, depois de formada e instalada, a Comissão elegerá seu
presidente e o relator, que terá prazo de dez dias para estudar o assunto e
emitir seu parecer, sendo entrevistado várias vezes, diariamente, sobre a
denúncia. A etapa seguinte será a votação do parecer pela Comissão. Seja qual
for o resultado, será depois submetido ao plenário, que finalmente então
decidirá se a presidente Dilma responderá a processo ou não.
Por fim, é bom lembrar que todo esse ritual pode ser
bagunçado pelos senadores do PT, pedindo vistas, levantando questões de ordem e
tudo o mais, Ou seja, o país vai ficar longo tempo com uma presidente-zumbi
sentada no Planalto, até desencarnar totalmente, vejam a situação surrealista
criada pelo Supremo, ao dar pitacos em assuntos que só dizem respeito ao
Congresso, desrespeitando a indispensável independência dos Poderes da
República. Mas quem se importa?
Mais uma vez vou citar o Gabriel Garcia Marquez: "Na américa latina, tudo é muito lento, uma semana pode demorar décadas". Quanto tempo pode demorar o IMEDIATAMENTE?
ResponderExcluir(argento) ... em minha "santa inguinoranssa", começo a achar que estamos sob Golpe; não o que a prisidanta alega estar sofrendo, mas algo como um "plano B", engendrado sob os auspícios do PC - quero estar errado ...
ResponderExcluirEm minha humilde arrogância, também considero que estamos sob golpe, a questão é: qual golpe será o vencedor?
ExcluirSe demorar mais um pouco esse hiato para ocupar a pres. da república o povo vai perceber que esse cargo só atrapalha e não faz falta nenhuma rsrsrs....
ResponderExcluirConcordo.
ResponderExcluirEscrevi a respeito em http://www.marcelobessa.com.br/2016/04/por-que-demora-no-senado.html?m=1
Parabéns pelos seus textos.
Obrigado, Marcelo.
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