Muito curiosa a situação da página de Opinião de O Globo de
hoje, onde Veríssimo e Magnoli falam basicamente sobre as mesmas coisas com opiniões diferentes, é óbvio. Diga-se de passagem que desconhece-se a fonte
de leitura de Veríssimo, mas o texto nos permite deduzir que tenha sido um desses
sites que eram pagos pelo governo do PT para contar mentiras.
A passagem
Luis Fernando
Veríssimo
Li que o programa de
interiorização de médicos, inclusive médicos de outros países - a maioria de
Cuba -, tem sido um sucesso, depois de veementemente combatido na sua
implantação. Um dos resultados desta e de outras iniciativas na mesma área é
que diminuiu o índice de mortalidade infantil no país, talvez o principal
parâmetro para se julgar um governo. O programa da casa própria não alcançou
todas as suas metas, mas alcançou o bastante para dar moradia decente a
milhares de famílias. O acesso à educação superior democratizou-se como nunca
antes. O Bolsa Família tirou muita gente da miséria.
O que estas e outras medidas de inclusão social têm em comum
é que representam o que os neoliberais mais odeiam, que é a intervenção de um
Estado centralizador no que, segundo eles, deveria ser tarefa do mercado. O
Temer já disse que não vai mexer em nenhum dos programas sociais deixados pelo
PT, mas, cedo ou tarde, mesmo contra a sua vontade, a lógica de uma opção pela
austeridade e pelo Estado mínimo o levará a trair sua vontade, se é que ela
existe mesmo. Você não vai para a cama com a Fiesp esperando manter sua
virtude.
Se o que o PT deixou na sua longa passagem pelo governo foi
fruto de contabilidade criativa, corrupção e tudo o mais que lhe atribuem, às
vezes com gráficos e power point, também foi fruto de uma clara priorização de
carências sociais inédita na nossa história. Isto não é uma defesa do rouba mas
faz, é uma lembrança que a passagem do PT não deixou só lixo, deixou pelo menos
uma tentativa de diminuir a desigualdade e a injustiça social que nos assolam.
É difícil encontrar entre os analistas econômicos do país um
defensor do Estado keynesiano. Para ter algum tipo de respaldo na crítica ao
nosso conservadorismo reacionário, deve-se recorrer a estrangeiros, gente como
o Paul Krugman, o Joseph Stiglitz e agora o Thomas Piketty, que chama a
austeridade pregada pelo capital financeiro pelo seu nome verdadeiro, um ardil
para o status continuar quo, num mundo dominado pelo neoliberalismo.
Odeio você
Demétrio Magnoli
No Citibank Hall, em São Paulo, Caetano e Gil conduziram a
plateia numa versão de “Odeio você” que se completava com “Temer”. Há motivos
para a indignação contra um governo recheado das velhas figuras do PMDB,
assentado no chamado “Centrão” e salpicado pela gosma de preconceito dos
pregadores-negociantes. Contudo, os dois músicos e seu público não apenas
rejeitavam o presidente adventício como também se solidarizavam com a
dissolvida ordem lulo-dilmista. O evento, um entre tantos que envolvem
intelectuais e artistas, evidencia a eficácia da narrativa do “golpe
parlamentar”. É mais uma volta no parafuso que prende a esquerda brasileira a
lideranças e ideias regressivas. O fracasso não ensinou nada - e apagou as
páginas de lições prévias.
Lula e Dilma, depois de tudo - é sério isso? Os heróis da
esquerda são os compadres de Marcelo Odebrecht, os chefes dos
gerentes-operadores da Petrobras, o óleo na engrenagem de um capitalismo de
subsídios e sombrias negociatas. Na ordem lulo-dilmista, circulavam como
aliados e associados os mesmos canalhas que rodeiam o atual governo. O que eles
“odeiam” não é a presença perene dessa gente, mas a ausência de seus heróis sem
nenhum caráter. O Temer que eles odeiam é a implicação necessária dos governos
que eles amaram.
No campo político da esquerda, nada se aprendeu sobre uma
política econômica amparada nas rendas extraordinárias do ciclo internacional
da “globalização chinesa”, que nunca gerou ganhos de produtividade e se
concluiu numa depressão tão profunda quanto à do colapso cafeeiro. E nada se aprendeu sobre políticas sociais
referenciadas em estímulos conjunturais ao consumo e transferências diretas de
renda, que se esgotaram sem reformas de fundo. Enquanto ainda cantam as glórias
petistas, eles escondem de si mesmos a permanência de uma educação pública em
ruínas e as carências humilhantes dos serviços públicos de saúde. Eles gostam de cotas, não de direitos
universais.
O que sobra de uma esquerda cega à desolação das nossas
metrópoles cindidas em guetos sociais e, portanto, estruturalmente violentas? Por que eles amam tanto o retrógrado Minha
Casa Minha Vida, um programa que ergue habitações populares distantes dos
centros das cidades, reiterando um padrão secular de segregação espacial? Copa,
Jogos Olímpicos, Porto Maravilha: a roda da fortuna da especulação imobiliária.
Numa mesa-redonda, Guilherme Boulos, o líder do MTST,
inverteu a sequência temporal dos eventos para justificar a falência econômica
da Venezuela chavista pelo colapso das cotações do petróleo. A caravana do
“Odeio você” avança, de olhos vendados, rumo ao passado. Eles não reconhecem
que, sob Hugo Chávez, somente se aprofundou a histórica dependência venezuelana
das rendas petrolíferas, nem que a “revolução bolivariana” implodiu sob o peso
de seus próprios erros, degenerando num regime autoritário, repressivo e
impopular. No século XXI, a esquerda brasileira ainda cultua a figura do
caudilho latino-americano.
Podemos ter nosso próprio Che? Wagner Moura, cuja
inteligência política é inversamente proporcional a seu talento dramático,
clama por recursos públicos para um filme sobre Marighella. Ele quer cercar seu
personagem com a auréola do romance, ajudando a convertê-lo em marco de
memória. A luta armada, o “foco revolucionário”, ofereceu os pretextos ideais
para a evolução da máquina repressiva, contribuindo involuntariamente com a
sedimentação da ditadura militar. À luz da história, compreende-se o erro
trágico dos militantes que se engajaram naquela aventura. Já a romantização da
tragédia, tanto tempo depois, e na vigência das liberdades democráticas, deve
ser classificada como o ato típico de um idiota.
Na Europa, as correntes principais da esquerda aprenderam
com a experiência totalitária soviética o valor fundamental da democracia. Na
América Latina, o percurso de aprendizado foi interrompido pela Revolução
Cubana, com seu infindável cortejo de mitos. Cuba é o nome da caverna escura
que aprisiona a esquerda brasileira. Um quarto de século atrás, o PT chegou a
qualificar o regime castrista como uma ditadura indefensável. Hoje, celebra
tanto o defunto “modelo socialista” cubano (isto é, o estatismo stalinista)
quanto as reformas econômicas deflagradas por Raúl Castro (isto é, um sistema
de mercado sem a contrapartida de direitos políticos e sindicais). Nesse pátio
de folguedos do anacronismo ideológico, encontra-se com sua dissidência
agrupada no PSOL.
“Odeio você, Cunha!”. A performance da esquerda apoia-se num
álibi primário. Eles dizem, com razão, que Eduardo Cunha está no DNA do governo
Temer. Porém, obliteram o fato de que, sem a engrenagem da corrupção partidária
institucionalizada sob o lulo-dilmismo, Cunha seria apenas mais um corrupto de
terceira classe. O ódio caetaneado, um produto político seletivo, opera
simultaneamente nos registros da memória e do esquecimento. Cunha é Temer - mas
é também Lula e Dilma.
Nos idos de junho de 1968, interpretando “É proibido
proibir”, Caetano desafiou uma plateia que urrava contra as guitarras elétricas
dos Mutantes, pateticamente identificadas ao “imperalismo americano”.
Hipnotizados pelo romance da esquerda latino-americana, os jovens odiavam tudo
que não fosse Vandré. O Caetano de hoje representa a negação do Caetano
original: no Citibank Hall, ele arrependeu-se de si mesmo, curvou-se às vaias
do passado, escreveu o epílogo de uma biografia autorizada.
Pablo Milanés desempenhou, ao longo de décadas, o triste papel
de trovador oficioso de Fidel Castro. Caetano faz uma melancólica imitação
tardia, candidatando-se a trovador de Lula e Dilma. Ninguém deveria odiá-lo por
esse motivo. No fim, sua performance reflete os fracassos e as frustrações de
uma esquerda enclausurada na gruta de seus mitos. O “velhote inimigo que morreu
ontem” está entre nós, bem vivo.
(argento) ... a propaganda derreteu o cérebro do Veríssimo; talvez não tenha entendido que o programa mais médicos tinha o objetivo (não confessado) de transferir dinheiro do contribuinte braZileiro direto para os cofres de Cuba (leia-se engordar o patrimônio da famíglia Castro).
ResponderExcluir(argento - seu voto é uma arma apontada contra sua cabeça) ... não tá na hora de quebrar o "Yop Secret"?
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