domingo, 11 de setembro de 2016

Por que todo esquerdista cita Getúlio Vargas?

Flavio Morgenstern

Por que logo o fascista brasileiro?

O Brasil é famoso por seus períodos de autoritarismo o mais desabrido em tempos de república. Apesar de a expressão ditadura militar causar engulhos em pessoas que se impressionam com palavras, e não com seu significado, o período mais autoritário, violento e perigoso da história brasileira foi aquele orquestrado por Getúlio Vargas.

Como lembra Bruno Garschagen na Gazeta do Povo, a própria república é inaugurada com um golpe militar. E golpe não faltou no Brasil:

A história da república presidencialista brasileira é uma sucessão de golpes e do desenvolvimento de uma tradição política autoritária. A república nasceu maculada com o golpe militar que derrubou a monarquia. A república começou com duas ditaduras (Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto). A República Velha terminou em estado de sítio seguido de um golpe militar.

A Era Vargas começou com um golpe eufemisticamente chamado de “Revolução de 1930” e sediou um golpe dentro do golpe em 1937, eufemisticamente batizado de “Estado Novo”. Um golpe afastou Getúlio Vargas do poder em 1945 e novas eleições foram convocadas.

Em 1964, um contragolpe impediu o golpe orquestrado pelas forças ideológicas e políticas que sustentavam o governo de João Goulart. Golpe, portanto, não é novidade no Brasil. Novidade é acusar de golpe aquilo que, definitivamente, não é.

Mas ninguém se compara em autoritarismo, em violência, em perseguição política, em chumbo, em tortura, em morte ao Estado Novo de Getúlio Vargas. Contudo, como não foi chamado pela história de “ditadura”, crianças e adolescentes não pensam imediatamente em Getúlio Vargas ao ouvir tal palavra.

Getúlio Vargas não era apenas autoritário. Era admirador do fascismo. Queria criar um verdadeiro Estado totalitário no Brasil: nada poderia funcionar independentemente do Estado. Não se tratava apenas de perseguir opositores, como na ditadura militar: tratava-se de fundir Estado e sociedade. Quem discordasse, não tinha apenas sua pena censurada: tinha seu direito à existência negado.
Foi durante a “era Vargas”, este eufemismo que esconde uma ditadura brutal que matou provavelmente mais de 3 mil pessoas com uma população infinitamente menor, que o maior Partido Nazista fora da Alemanha hasteava sua bandeira com suástica no Rio de Janeiro. Não fosse uma manobra americana, o Brasil teria lutado na Segunda Guerra do lado do Eixo. Getúlio, a contragosto, lutou pelos Aliados.

Getúlio não usava leis de apelo popular por segurança pública, como a Lei de Segurança Nacional: simplesmente jogava na cadeia, inclusive escritores como Graciliano Ramos (que escreveu Memórias do Cárcere enquanto era prisioneiro de Getúlio) e não precisava nem de uma justificativa para o apoio popular.

Curiosamente, o maior inimigo de Getúlio Vargas foi um comunista, treinado na própria União Soviética: Luís Carlos Prestes, da Coluna Prestes. No Brasil, emulava-se o conflito entre totalitarismos da Europa da década de 30: fascistas de um lado, comunistas de outro.

Prestes e sua mulher, Olga Benário, eram mandantes de sessões de tortura de dissidentes. Ainda em sua fase abertamente fascista, Getúlio Vargas fez um acordo com os nazistas para deportar Olga, uma ex-arruaceira alemã, diretamente para o Terceiro Reich.

Seguindo pari passu a cartilha fascista, Getúlio perseguia comunistas (numa época em que eles não tinham medo de admitir o que são) e fazia acordos populistas, no que posteriormente foi tanto chamado de populismo (na política) quanto de trabalhismo.

Na época, o verdadeiro nome era corporativismo: um sistema em que os interesses econômicos eram divididos por classe (bancários, operários, mineradores etc), e todas as relações eram tratadas coletivamente através de associações de classe.

O fascismo, por exemplo, unifica sindicatos para avançar com o sindicalismo político para, assim que toma o poder, imiscuí-las com o Estado e perseguir qualquer associação (como um sindicato) com interesses rivais. O interesse de um coletivo é sempre sobrepular o interesse do coletivo rival (operários x patrões, trabalhadores alemães x judeus etc).

O fascismo morreu, o corporativismo mudou de nome. Virou sindicalismo e, desassociado do nacionalismo e do fascismo original, tornou-se a versão urbana do movimento operário socialista, guiado pela União Soviética.

Contudo, o método permaneceu o mesmo: nenhuma propriedade é absoluta, os grandes líderes permanecem cultuados como salvadores, faz-se marchas públicas fechando ruas para forçar acordos econômicos vantajosos e, sobretudo, os sindicatos e políticos do trabalhismo forçam leis e direitos trabalhistas que estancam a economia, mantendo todos engessados numa grande fábrica onde todos são trabalhadores.

É a luta para “corrigir as desigualdades” ou, hoje, “distribuir renda”.

Quem criou a primeira compilação de tais direitos trabalhistas foi Getúlio Vargas, ainda na fase fascista, ao criar a CLT, em voga até hoje. Novamente Bruno Garschagen, em seu livro Pare de Acreditar no Governo. Por que os Brasileiros não Confiam nos Políticos e Amam o Estado, comenta que a CLT não é exatamente uma cópia da Carta del Lavoro, a legislação trabalhista de Mussolini, mas sua principal inspiração.

Com todo este panorama, voltamos a 2016. E todo, praticamente todo senador que vai defender Dilma Rousseff contra o impeachment, ao tentar dar uma burilada e uma aparência de profundidade a seu voto, cita como grande exemplo de estadista, justamente como continuísmo da linha corporativista, Getúlio Vargas.

Ele é simplesmente o nome obrigatório da esquerda. A esquerda, que jura que é contra a ditadura e que lutou por “democracia”, não consegue pensar em um estadista que poderia admirar no Brasil que não seja Getúlio Vargas – e praticamente apenas o que fez quando quase conseguiu transformar o Brasil em um país fascista.

A esquerda, que jura que o nacional-socialismo nada tem a ver com o socialismo internacional, não consegue pensar em liderança com a qual se identifique mais do que Getúlio Vargas, que inclusive mandou queimar com um maçarico os pés do terrorista esquerdista Carlos Marighella.

Não custa lembrar que vários votos na Câmara dos Deputados a favor de Dilma foram “por Getúlio” e também Glauber Braga (PSol-RJ) soltou um belo “por Marighella”. Todos votos de esquerda, todos votos contra o impeachment. E é a esquerda que ajuramenta que “estudou História”.

Nem para pensar em um estadista mais próximo de uma, digamos, social-democracia que poderia em tese ser aparentada do PT, como Fernando Henrique Cardoso. Tem de ser Getúlio Vargas. Tem de ser um fascista.

A esquerda confia cegamente na ignorância do povo, que só tinha esquerdistas para conhecer alguma noção de mundo em aulas de História. Sempre venceu cegamente. Com a internet, sua hegemonia de dominação pela cegueira pode começar a ruir


2 comentários:

  1. (argento) ... numa "chamada" para um programa dominical (Famílias), um ator mirim declara que jogou o celular do pai pela janela, e completa: "- tenho essa mania" ... na primeira porrada perderia a "mania" ... sem risco algum de perder o talento.

    ... "de tanto ouvir falar, o povo, massa-de-manobra, acredita" - nunca saberá realmente o que ocorria na época ...

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    1. (argento) ... a bem da verdade, a "lei das tapas e berlusconis" intimida muito a massa-de-manobra ,,,

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