sexta-feira, 12 de junho de 2015

Marco Aurélio Mello se acha

Percival Puggina

Há poucos dias, no programa Espaço Público da TV Brasil, o ministro Marco Aurélio Mello criticou a condução do processo relativo à operação Lava Jato. Afirmou ele: “Não posso desconhecer que se logrou um número substancial de delações premiadas e se logrou pela inversão de valores, prendendo para, fragilizado o preso, alcançasse a delação. [Isso] não implica avanço, mas retrocesso cultural. Imagina-se que de início [a delação premiada] seja espontânea e surja no campo do direito como exceção e não regra. Alguma coisa está errada neste contexto”.

“Meno male!” (menos mal), diria meu avô, que o ministro reconheceu a importância das referidas delações premiadas. Mas é preocupante saber que na opinião de Sua Excelência, algo que tanto favoreceu o desbaratamento da maior teia de corrupção da história foi obtido por meio errado. Réus teriam sido presos para serem fragilizados e, com isso, obtida a delação.

Ouvindo o que o ministro não disse, mas deixou para lá de implícito, ele gosta de confissão de réu arrependido, contrito e altivo, entregue às mãos da Justiça e robusto na vontade. Intacto em sua liberdade. O ministro apreciaria muito que as delações acontecessem por adesão ao bem. Ele também não disse, mas deixou implícito, que o Dr. Sérgio Moro, o juiz federal paranaense que o Brasil conheceu e aprendeu a admirar, era “a coisa errada neste contexto”. Afinal, é dele a condução e foram dele as decisões sobre prisões até as contraordens de Teori Zavascki.

Impressionante a opinião do ministro. A vida, segundo ele, é muito melhor do que a vida é. Réus abrem o coração mesmo que advogados não queiram. Devem ser imunes a pressões e a ninguém pressionar. Bandidos não destroem provas nem se evadem. Suponho que no garantismo tão apreciado pelo ministro tampouco haja inundações, secas, epidemias ou movimentos das placas tectônicas.

Não, eu não estou errado quando digo que os membros das instituições estão muito bem para se preocuparem com o Brasil real.

Marco Aurélio Mello se acha. Tem certeza que a Justiça e as Leis foram criadas exclusivamente para serem interpretadas exclusivamente por ele. Para mim ele é igual a um cachorro que não deixa passar uma gota de mijo alheio sem pingar o seu por cima, para marcar território. 

Um comentário:

  1. Não pretendo defender o juiz, mas a argumentação que ele apresentou será usada pela defesa e existe o risco de melar os depoimentos. A argumentação do Marco Aurélio é correta no sentido retórico, mas sobre a Operação Lava Jato está equivocada, ele interpreta aquilo que está sendo divulgado na imprensa e não aquilo que está nos autos. É a imprensa que está vendo a ideia de que as prisões estão sendo usadas para conseguir a delação premiada, e o próprio Puggina argumenta que prender para conseguir a delação é aceitável, até mesmo louvável, quando é pura e simplesmente contrário ao direito democrático.

    As prisões foram realizadas com base em provas e fundamentos jurídicos, teve inclusive quem foi solto e depois preso novamente. As delações não revogaram as prisões, apenas mudaram para um regime mais brando. Então essa história de que prenderam para conseguir a delação é pura bobagem.

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