A Guerra do Vietnã continua firme. Secretamente, EUA e União
Soviética aceleram a corrida armamentista. Estamos em 1971 e o clima é tenso.
Mas aí uma turma de pacifistas se junta pra fazer algo nunca visto. Alugam um
barco e navegam até o Alasca para protestar contra os testes nucleares
americanos.
Incrivelmente, dá certo: pressionado pela opinião pública, o
governo interrompe os testes. Os ativistas ganham a atenção do mundo e formam o
que viria a se tornar uma superpotência ambiental - o Greenpeace, hoje presente
em mais de 40 países. Um dos tripulantes nessa primeira missão era o canadense
Patrick Moore: na época, um hippie com 24 anos e cabelos longos.
Três décadas depois, tudo mudou. A Guerra Fria e os hippies
estão extintos. As grandes preocupações são a emissão de poluentes, a comida
transgênica e o aquecimento global. Patrick Moore, agora um senhor, também está
diferente. E como: hoje defende tudo o que os ecologistas clássicos mais
detestam. Execrado por seus antigos colegas, ele se tornou o inimigo número 1
do Greenpeace: talvez porque, além de ter cometido “traição”, defenda com
inteligência suas opiniões. Será que ele tem razão? Ou simplesmente se vendeu?
Recentemente, você
escreveu: “Fico triste em ver os ativistas ecológicos se equivocando tanto, com
informações e prioridades tão erradas”. De fato, às vezes ongs ambientalistas
são acusadas de agir politicamente, ignorando a ciência. O que aconteceu?
Na década de 1980, o movimento ambiental começou a ficar
mais extremista. E existem dois motivos para isso. Primeiro, naquela época a
maioria das pessoas já aceitava as nossas propostas (dos ecologistas). Então, a
única forma de continuar “do contra”, questionando o establishment, era adotar
posições mais e mais extremas - eventualmente abandonando a ciência e a lógica.
O outro motivo foi o fim do comunismo. Muitos ativistas políticos de esquerda
migraram para o movimento ambientalista. Eles aprenderam a usar termos “verdes”
para defender seus projetos - que têm muito mais a ver com anticapitalismo do
que com ecologia. Em 1985, eu era o único diretor do Greenpeace com formação
científica, um mestrado em ecologia. Os meus colegas não respeitavam isso e
diziam: “Somos todos ecologistas”.
Aí você resolveu
sair.
Eu estava cansado de ser contra tudo, queria achar soluções
para as coisas. Em 1982, ouvi pela primeira vez o termo desenvolvimento
sustentável e percebi que esse era o desafio: incorporar ao dia-a-dia os
valores ecológicos. Mas o Greenpeace não estava interessado. Defendi, por
exemplo, o cultivo de peixes como alternativa à pesca indiscriminada. Eles não
concordaram. Além disso, na época o Greenpeace queria banir o uso de cloro.
Eu disse que a água clorada era o maior avanço na história da saúde pública.
Eles não se importaram e iniciaram uma campanha contra o cloro que dura até
hoje. Eu não podia continuar numa organização assim.
E hoje? Como você vê
o Greenpeace?
O Greenpeace influencia muito as políticas públicas. Mas
está fazendo mais mal do que bem. Suas campanhas contra alimentos transgênicos,
energia nuclear, cloro, criação de peixes em cativeiro e exploração florestal
são todas baseadas em medo e desinformação. Eles dizem que querem reduzir o
consumo de combustíveis fósseis - mas aí se opõem às principais alternativas,
que são a energia nuclear e a hidrelétrica. Eles falam como se fosse possível
resolver tudo com energia solar e eólica - o que é claramente impossível.
Você costuma ser
acusado de trair o movimento ecológico, de se vender ao inimigo porque hoje dá
consultoria a empresas, inclusive da área nuclear. Você virou a casaca?
Eu não mudei de lado, pois sempre acreditei que nós
precisamos equilibrar as necessidades das pessoas com a proteção do ambiente. O
que há de errado em ajudar a indústria a vencer desafios ambientais? Afinal é
ela, com seus produtos e serviços, que torna a vida civilizada possível. Al
Gore e os líderes do Greenpeace vivem com todos os confortos modernos, mas
querem que nós voltemos a uma espécie de era pré-industrial.
Transgênicos poderiam
acabar com a desnutrição no planeta. Bloquear sua utilização é um crime contra
a humanidade. O Greenpeace deveria ser julgado por fazer isso.
O aquecimento global
é o tema ambiental que mais mobiliza a atenção do público hoje. Na sua opinião,
esse é um problema que merece tal importância?
O aquecimento é uma questão importante, merece a nossa
atenção. Mas não sou alarmista e não acho correto usar termos como caos ou
catástrofe climática. E também não acho possível provar, cientificamente, que
os seres humanos são a causa do aquecimento global. Não é razoável supor que os
fatores ambientais que sempre guiaram o clima, durante toda a história da
Terra, deixaram de existir - e nós, agora, somos os grandes causadores das
mudanças. As elites políticas estão tentando assustar o público para ganhar
controle sobre ele. Na minha opinião pessoal, a maior questão ecológica é a
pobreza. Sociedades pobres não conseguem limpar a água que sujam, nem replantar
as árvores que cortam.
Mas e os relatórios
divulgados recentemente pela ONU? Um deles afirma que, se a temperatura subir
1,5 0C, 30% de todas as espécies animais e vegetais correrão perigo de
extinção.
Essa afirmação parece absurda. A Terra já foi muito mais
quente. Hoje, a temperatura média está em 14,5 ºC. Por boa parte da história do
planeta, chegou a 22 ºC - nem existia gelo nos pólos. As espécies que hoje
estão vivas sobreviveram a esses períodos quentes. Eu até acho que seria uma
boa idéia reduzir o consumo de combustíveis fósseis, mas pela qualidade do ar e
por questões geopolíticas, como reduzir o conflito com o Oriente Médio.
Você defende a
energia nuclear. Mas o fato é que ela sofre rejeição maciça da sociedade.
O movimento ambiental, especialmente o Greenpeace, foi
criado sob o temor de uma guerra nuclear (entre os EUA e a antiga União
Soviética). Nós cometemos um erro, que foi tratar a energia nuclear da mesma
forma que as armas nucleares - como se fossem parte do mesmo holocausto. Não
faz sentido banir uma tecnologia só porque ela pode ser usada para o mal. Se fosse
assim, os humanos jamais teriam usado o fogo. A energia nuclear não sofre
rejeição maciça - na verdade, ela é cada vez mais aceita em todo o mundo.
Mas e o lixo nuclear,
ou a possibilidade de vazamento de radiação?
Atualmente é fácil controlar o lixo nuclear. Ele não vaza,
pois não é líquido - é um material sólido envolvido por camadas de metal e
concreto. Não escapa para o ambiente, como a poluição produzida pela queima de
combustíveis fósseis. Além disso, creio que o perigo da radioatividade tem sido
exagerado, para assustar as pessoas. Todos nós somos expostos e recebemos
radiação todos os dias. Mas só altos níveis de radiação são perigosos - e só
Chernobyl lançou esses níveis no ambiente até hoje. Nunca mais, porém, existirá
um reator tão mal projetado quanto o de Chernobyl.
Você é a favor dos
alimentos transgênicos?
Nunca se provou que as plantações geneticamente modificadas
façam algum mal à saúde - ou ao ambiente. Pelo contrário, há muitos efeitos
positivos, como menos uso de pesticidas, menor exposição do lavrador a produtos
químicos, menos erosão do solo. Alguns tipos de transgênicos poderiam acabar
com a desnutrição - como o arroz dourado, que incorpora ferro e vitaminas A e
E. E essa tecnologia já existe. Mesmo assim, o Greenpeace continua a bloquear a
utilização. É um crime contra a humanidade que deveria ser julgado em tribunal
internacional. A oposição aos alimentos transgênicos se baseia em ignorância e
medo.
Você disse que, para
o ambiente, “os automóveis são a tecnologia mais destrutiva já inventada pela
humanidade”. Como vê o carro a álcool? E o carro a hidrogênio?
O carro a hidrogênio não será viável num futuro próximo,
pois há muitos obstáculos técnicos. Já o álcool é uma boa alternativa, pode ser
o biocombustível do futuro.
Num de seus textos,
você diz que a humanidade deveria consumir mais madeira e que isso faria bem ao
planeta. Como assim?
A madeira é a maior fonte de energia renovável que existe. E
sua exploração leva ao reflorestamento. O que prejudica as florestas é a
agricultura. Quando compramos madeira, estamos estimulando a plantação de mais
árvores para satisfazer à demanda. Os países que mais consomem madeira são os
que têm as florestas mais saudáveis.
Certo, mas isso não
acaba reduzindo a biodiversidade? Afinal, geralmente vários tipos de árvore são
derrubados - mas apenas uma espécie é replantada no lugar.
A exploração florestal mexe, sim, com a biodiversidade. Mas,
tendo um sistema de áreas intocadas e reservas ecológicas, é possível preservar
ao máximo a biodiversidade - e ainda assim ter uma boa produção de madeira.
Os ativistas
ecológicos tendem a fazer previsões pessimistas para o futuro. Qual é a sua?
Acho que há motivos para ser otimista. As pessoas estão
vivendo mais, e com mais saúde. As espécies não estão desaparecendo no ritmo
que os catastrofistas previam. A população mundial deve se estabilizar em 9
bilhões - e nós vamos conseguir alimentar toda essa gente. A tecnologia está
ficando mais limpa, mais verde - e as pessoas estão mais conscientes do que nunca
sobre o ambiente.
Foram duas mudanças extremas e em direções contrárias. O Greenpeace virou uma arrecadadora de doações, dedicada ao ativismo político destrambelhado, enquanto que a energia nuclear se tornou cada vez mais segura e eficiente.
ResponderExcluirE sempre defenderam o aborto... menos dos animais, é claro.
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