A maioria dos responsáveis pelos déficits das fundações
públicas tem em comum a origem no ativismo sindical. Nos últimos 12 anos, os
principais gestores dos fundos de Petrobras, Banco do Brasil, Caixa e Correios
saíram das fileiras do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
É uma característica dos governos Lula e Dilma, e as razões
têm mais a ver com perspectivas de poder e negócios do que com ideologias.
Os sindicalistas-gestores agem como força-tarefa alinhada ao
governo. Compõem uma casta emergente na burocracia do PT. Agregam interesses
pela capacidade de influir no acesso de grandes empresas ao Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT), fonte principal de recursos subsidiados do BNDES. Onde não
têm hegemonia, por efeito do loteamento administrativo, convivem em tensão
permanente com indicados pelo PMDB e outros partidos, caso do Postalis.
O uso dos fundos de pensão estatais como instrumento de
governo é um traço peculiar do modo de organização política brasileira.
Moldadas no regime militar, as 89 fundações públicas existentes dispõem de uma
reserva de investimentos (R$ 450 bilhões no ano passado) que seduz governantes:
permite-lhes vislumbrar a possibilidade de induzir iniciativas econômicas, por
meio da participação dos fundos na estrutura de propriedade das empresas
envolvidas. Petros, Previ, Funcef e Postalis, por exemplo, concentram dois
terços do patrimônio dos fundos públicos.
Essas entidades paraestatais cresceram nas privatizações
iniciadas por Fernando Collor e Itamar Franco. Com Fernando Henrique Cardoso,
passaram ao centro das mudanças na mineração (Vale) e nas comunicações
(Telefônicas).
Quando chegou ao Planalto, em 2003, Lula estava decidido a
ampliar esse canal de influência sobre o setor privado, pela via da
multiplicação da presença dos fundos de pensão estatais e do BNDES no quadro
societário das empresas.
Havia um projeto, desenhado desde os primórdios do PT e da
Central Única dos Trabalhadores, por iniciativa de Luiz Gushiken, então
presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
Tipo incomum, ascendera à liderança sindical convocando
greves a bordo de terno e gravata. Trocou a militância no comunismo trotskista
pela composição com Lula, líder dos metalúrgicos, a partir de uma conversa de
botequim. Ajudou a escrever o primeiro estatuto, presidiu o PT, elegeu-se
deputado federal três vezes e se tornou um dos mais influentes assessores de
Lula.
Foram os negócios nada ortodoxos entre fundos estatais e
empresas privadas durante o governo Collor, em 1991, que levaram Gushiken e
dois diretores do sindicato paulistano, Ricardo Berzoini e Sérgio Rosa, a abrir
o debate dentro do PT sobre o potencial político dos fundos de pensão — até
então percebidos como meros instrumentos governamentais de cooptação de
sindicalistas.
No ano seguinte, a cúpula político-sindical do PT elegeu
bancários para diretorias da Previ e da Funcef, derrotando a velha guarda da
Confederação dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito.
O grupo avançou com a eleição de Berzoini à presidência do
sindicato paulistano, com Sérgio Rosa e João Vaccari Neto na diretoria. Meses
depois, esse trio teve a ideia de entrar no ramo imobiliário com apoio
financeiro dos fundos de previdência: nascia a Bancoop, cooperativa
habitacional, hoje alvo de múltiplos processos por suposto desvio de dinheiro
para campanhas do PT e calote em mais de dois mil clientes.
Gushiken decidiu não disputar o quarto mandato de deputado
federal pelo PT, em 1998. Berzoini ficou com a vaga. Elegeu-se, mas fez questão
de continuar na direção da Bancoop até a campanha presidencial de Lula, em
2002.
Na sede da CUT, Gushiken instalou um curso para formação de
sindicalistas em Previdência Complementar. Sinalizava o rumo nas apostilas: “No
Brasil, o fundo de pensão como fonte de poder ou como potente agente de
negociação nunca foi objeto de discussão nos sindicatos (...) Existe a
possibilidade, não remota, de que este monumental volume de recursos, oriundos
do sacrifício de milhões de trabalhadores, venha a se transformar num
gigantesco pesadelo para estes mesmos trabalhadores”.
O grupo testou o potencial de um fundo estatal na campanha
presidencial de 2002. Sérgio Rosa estava na diretoria de Participações da
Previ, onde decidem-se os investimentos. Numa quinta-feira, 9 de maio, ele
despachou cartas a uma centena de conselheiros do fundo em empresas privadas.
Pediu informações sobre como a disputa política “está sendo abordada na empresa
em que nos representa” e “qual o posicionamento” das companhias privadas quanto
à “participação efetiva no processo”.
Naquele ano eleitoral, as aplicações da Previ no mercado de
ações foram quadruplicadas. Adversários sindicais, como Magno de Mello e Valmir
Camilo, relacionaram as aplicações da Previ com doações de empresas privadas
para Lula e 254 candidatos do PT em todo o país.
Eleito, Lula deu à burocracia sindical 11 dos 33 ministérios
e partilhou diretorias na Petrobras, Banco do Brasil, Caixa e Correios com PMDB
e PTB, entre outros integrantes da “maior base parlamentar do Ocidente”, como
definia o ministro da Casa Civil, José Dirceu.
Gushiken ficou com a Secretaria de Comunicação; Berzoini foi
para o Ministério da Previdência; e Vaccari assumiu o sindicato em São Paulo.
Eles definiram com Lula o comando dos maiores fundos de pensão estatais a
partir do núcleo do sindicalismo bancário. Assim, Sérgio Rosa ganhou a
presidência da Previ, Wagner Pinheiro ficou com a Petros e Guilherme Lacerda
foi para a Funcef. Ao PMDB reservaram o menor, Postalis.
Na Previdência, Berzoini fechou o circuito com a nomeação de
um ex-conselheiro fiscal da Bancoop, Carlos Gabas, para a secretaria-executiva
do ministério, que controla o órgão de fiscalização dos fundos de pensão, a
Previc. Passaram os anos seguintes testando na prática o projeto que haviam
imaginado na década de 80. Os bons companheiros estavam no poder.
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Fundador de uma empresa que recebeu R$ 3 bilhões em
investimentos dos fundos de pensão da Petrobras, da Caixa Econômica Federal e
do Banco do Brasil, João Carlos Ferraz inquietou-se na cadeira ao ouvir as
perguntas:
— O senhor disse que num momento de fraqueza recebeu propina
milionária no exterior? Também prometeu devolver uma parte e repatriar outra?
O antigo presidente da Sete Brasil respondeu quase
sussurrando: — Gostaria de reafirmar que eu vou permanecer em silêncio.
Uma voz alta surgiu no plenário da CPI dos Fundos de Pensão,
ironizando: — Se é verdade, vai tomar um baita prejuízo, porque levou propina
com o dólar a dois reais e pouco e vai devolver a quatro e pouco... Talvez seja
um dos bons investimentos que a Petrobras fez nos últimos tempos.
Os fundos de previdência estatais ainda se encontram no lado
menos visível das investigações sobre corrupção nos negócios da Petrobras. Mas
as evidências dos enlaces em negócios suspeitos se espraiam por diferentes
inquéritos. E são realçadas pelo acervo de prejuízos bilionários que as
fundações acumularam nos últimos 12 anos.
O caso da Sete Brasil é exemplar. Criada no governo Lula,
dentro de uma Petrobras eufórica com o pré-sal, previa construir 28
navios-sondas para a petroleira. Os fundos Petros e Funcef compraram 18% das
cotas do empreendimento. A Previ se limitou a 3,5%.
Após meia década, empresa e sondas só existem no papel. O
dinheiro das aposentadorias virou pó: Petros e Funcef já perderam R$ 828
milhões, e Previ, R$ 161 milhões. Os fundos justificam o fracasso indicando as
“perspectivas favoráveis” do projeto em 2010, quando o barril de petróleo
custava US$ 100 (fechou a semana a US$ 33).
Sobraram propinas, como as recebidas por João Carlos Ferraz
e Pedro Barusco, ex-gerentes da Petrobras que montaram o projeto, se
aposentaram na estatal e viraram executivos da Sete Brasil. Na Justiça fizeram
acordos de delação, prometendo devolver os subornos: Barusco contabilizou US$
97 milhões (R$ 388 milhões); Ferraz declarou US$ 1,9 milhão (R$ 7,6 milhões), e
batalha para evitar o sequestro judicial dos bônus recebidos (R$ 11,5 milhões)
na presidência da companhia.
Os déficits nas fundações públicas têm origem em atos
típicos de gestão temerária, em negócios obscuros e nos frágeis sistemas de
controle.
— É notável que os fundos de pensão estatais integrem um
circuito bilionário de negócios sem controle efetivo — diz o deputado federal
Raul Jugmann (PPS-PE). — Os dirigentes não respeitam as regras, a fiscalização
faz vista grossa, a Comissão de Valores Mobiliários não tem poder para punir, e
o Congresso não entende, só se interessa pelo assunto episodicamente.
Organismos de fiscalização recebem apelos constantes para
intervenção nos fundos estatais deficitários. Responsável pela supervisão
setorial, a Previc, do Ministério da Previdência, responde com a lembrança “dos
limites legais de sua competência”, e a necessidade de “avaliar tecnicamente
pressupostos, necessidade e consequências”.
O histórico recente dos investimentos desses fundos de
previdência indica que apostas de alto risco, como a realizada na Sete Brasil,
não foram acidentais. Havia um grupo de sindicalistas-gestores trabalhando de
forma coordenada. Em agosto de 2003, eles se reuniram com Lula na sede da
Petrobras, no Rio. Saíram convencidos de que deveriam apoiar integralmente
todos os projetos governamentais de infraestrutura.
O alinhamento com o Palácio do Planalto, orientado pelo
secretário de Comunicação Luiz Gushiken, intensificou-se a partir da
autorização para confrontar parceiros privados — como o grupo Opportunity, do
banqueiro Daniel Dantas—, considerados impeditivos à participação mais direta
no controle de empresas de telefonia, privatizadas no governo anterior.
Estabeleceram uma rotina de reuniões, uniram recursos e partiram para a batalha
societária.
Venceram. Desde então, com respaldo do Planalto, houve uma
escalada nas aplicações de alto risco com o dinheiro das aposentadorias, a
despeito de contra-indicações jurídicas internas ou da oposição no conselho
fiscal.
— Na Petros adotou-se um estilo extremamente autoritário,
invertendo-se a lógica da governança— conta Fernando Siqueira, ex-representante
eleito nos conselhos fiscal e deliberativo.
Apesar das perdas e danos, o legado do loteamento político é
defendido pelos atuais diretores dessas fundações, também originários desse
proceso. A Funcef, por exemplo, admite “resultados deficitários”, mas os
atribui ao “fraco desempenho das economias nacional e internacional”. Acha que
se constitui num “modelo" de governança. A Petros se afirma empenhada em
“continuar reforçando” controles. No Postalis rejeita-se a palavra “déficit”.
Diz-se apenas que “não há previsão de superávit”.
Para aposentados como Livaldo Pereira de Souza, sócio da
Petros, Maria do Socorro Ramalho, da Funcef, e Jackson Mendes, do Postalis,
resta uma certeza: sua renda será reduzida. Com sorte, talvez consigam
recuperá-la antes do Carnaval de 2035.
(argento) ... Fatos são FATOS - é sempre bom lembrar aos que funcionam no "piloto automático" que, o Atual Guverno cumpre, à risca, a AGENDA de Tomada do Poder ditada pelo Foro de São Paulo.
ResponderExcluirJá que o assunto é roubalheira, que tal seguir o exemplo de Deus?
ResponderExcluirhttps://www.facebook.com/professorsabino/videos/984044555013271/
(argento) ... karáleo, Milton! - desenterrou, neste estudo, o que vem acontecendo desde os "tempos bíblicos", isto é, que "Sacerdotes", munidos de plenos poderes, Roubam, descaradamente, o Fruto do Trabalho do "Povo de Deus"; mais atual impossível! - hehehe, a Bíblia é foda!, melhor ainda se desvinculada das "doutrinas religiosas" ...
ResponderExcluirSolução divina para acabar com a roubalheira: destruir o templo (palácio do planalto e congresso) e para de pagar impostos. Deus é anarquista.
ExcluirReferência ao último parágrafo do post:
ResponderExcluirSe ainda estiverem vivos, o que parece ser difícil...