Ricardo Noblat - O
Globo
Se dependesse do presidente Michel Temer, o ministro Edson
Fachin, novo relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF),
suspenderia o mais breve possível o sigilo em torno das delações dos 77
executivos da construtora Odebrecht. Fachin substituiu o colega Teori Zavascki,
morto em um desastre de avião em Paraty, Rio de Janeiro.
- Seria melhor para todos que as delações fossem logo
divulgadas, e de uma vez - disse Temer em uma conversa informal de mais de uma
hora no fim de semana.
Em dezembro passado, durante um encontro no Palácio do
Planalto com Rodrigo Janot, procurador-geral da República, Temer adiantou para
ele a mesma opinião. Não houve discordância. Foi a pedido de Janot que a
ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, apressou-se a homologar as delações
na semana seguinte à morte de Zavascki.
- Imagine o que poderia acontecer se as delações demorassem
a ser divulgadas. Ou se fossem divulgadas aos poucos, uma por semana, digamos.
Seria muito ruim para o país e, é claro, para o governo - calcula o presidente.
E se o conteúdo das delações produzirem estragos na imagem
do governo? Afinal, alguns dos atuais ministros e o próprio Temer são citados
em mais de uma delas. Temer responde:
- Quem for atingido pelas delações que se explique e que se
defenda. Depois avaliaremos o que fazer. Quanto a mim, minha preocupação com
isso é igual a zero.
Temer foi citado 43 vezes no documento do acordo de delação
premiada de Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais
da Odebrecht. Em 2014, Temer pediu R$ 10 milhões a Marcelo Odebrecht, então
presidente da empresa, para a campanha eleitoral do PMDB naquele ano.
- Não foram R$ 10 milhões. Marcelo doou pouco mais de R$ 11
milhões. O dinheiro foi depositado na conta do PMDB e pagou despesas de vários
candidatos pelo país. Há comprovantes de tudo - garante Temer.
Ele conta que teve a curiosidade de ler com atenção a
íntegra da delação de Melo Filho vazada para a imprensa.
- Quem se limita a ler apenas os títulos das matérias
publicadas a respeito pode ficar com a impressão de que fui citado por
envolvimento em 43 negócios. Mas não. Fui citado 43 vezes porque está escrito
ali: Aí Temer me convidou para conversar. Aí Temer me recebeu na sala. Aí Temer
perguntou se eu aceitaria um café… Para contar uma única história, meu nome foi
mencionado 43 vezes - explica Temer, e até acha graça nisso.
Como presidente do PMDB, uma de suas tarefas era arranjar
dinheiro para financiar campanhas. E ele não nega que o tenha feito.
- Isso nada tem a ver com caixa dois ou com a troca do
dinheiro por favores do governo - registra. Quanto ao julgamento pela Justiça
Eleitoral das contas de campanha da chapa Dilma-Temer na eleição de 2014…
A propósito, Temer revela que ganha corpo entre juristas que
acompanham as investigações das contas a tese de que pode ter havido ali alguma
infração penal, mas eleitoral, não. Se penal, o caso seria arquivado no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dele se ocuparia a Justiça comum.
- Estou muito tranquilo, pelo que ouço dos meus advogados -
afirma o presidente.
O fato é que 2016 terminou – se é que terminou – deixando a
impressão em muita gente que Temer não concluiria o resto de mandato herdado da
ex-presidente Dilma Rousseff.
Em conversas com políticos em Brasília, mesmo entre aqueles
que apoiam o governo, diversas previsões foram feitas a respeito de seu futuro:
Temer poderá ser vítima da lentidão do processo de recuperação da economia… A
Justiça Eleitoral não tem como separar as contas de Dilma e de Temer, e ele
poderá ter que sair… Tem emenda à Constituição no Congresso que, se aprovada,
resultará em eleições diretas para presidente ainda em 2017…
Salvo um fato surpreendente, em um país acostumado a
conviver com surpresas, Temer completará o mandato de Dilma. Ele não enxerga
nenhuma surpresa capaz de desestabilizar seu governo – mas se enxergasse não
seria surpresa. E concorda que o pior para ele já passou. Passou o discurso do
golpe. Passaram as manifestações de ruas. A economia começou a reagir, embora
menos do que ele gostaria. É vida que segue.
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